31.10.06

SAINDO NA FRENTE

Quero sair na frente, numa espécie de exercício rigorosamente ditado pela vaidade e pela imodéstia. Explico. Muito em breve - vocês verão - as colunas dos jornais exaltarão o lançamento daquilo que o meu irmão Szegeri chama, com muita propriedade, de vade-mecum de otário: o "Guia Rio Botequim", edição 2006, que sairá, ainda em novembro, com o subtítulo "os melhores petiscos e comidas de bar". Juro, de pé junto e de dedos cruzados diante dos lábios, que ainda não tive acesso ao lixo. Sobre ele sei, apenas, que foi escrito (ou planejado, ou organizado, ou sei lá o quê) por Guilherme Studart, homem exaltado pelo Jota em 29 de agosto de 2006, aqui, como o "mais rigoroso pesquisador do assunto na cidade". Feito o breve intróito, vamos às minhas considerações ainda no escuro (eis aí, no eventual acerto dessas considerações, o êxito do exercício a que me proponho).

Preciso ser preciso, razão pela qual transcrevo a resenha do tal livro:

"Este livro é um guia da boemia carioca que apresenta as delícias da culinária popular. Além de apresentar vinte pratos e petiscos provados e comentados em edição totalmente ilustrada, mostra como degustar e onde encontrar o melhor da comida de botequim - petiscos e tira-gostos, caldos e sopas, sanduíches e pratos principais."

Vejam se meu irmão paulista não está coberto de razão quando se refere ao troço como um livro para otários. Quem - me digam quem! - é que entende e que gosta do riscado e está a fim de aprender "como degustar" comida de buteco? Mais, mais: quem é que vai a buteco degustar alguma coisa? Quem? O que será - chega a dar agonia prever o que vem por aí - que "o mais rigoroso pesquisador do assunto na cidade" tem a ensinar ao cidadão que quer, pura e simplesmente, sentar-se à mesa de um buteco vagabundo, beber, comer e jogar conversa fora?

A carne assada com coradas do Rio-Brasília, buteco comandado com maestria pelo Joaquim e pela Terezinha, estará no tal guia? Evidentemente que não.

A dobradinha do Quitutes da Vovó, espelunca amável na Rua do Matoso estará? Também não.

O glorioso Bar do Chico, na Tijuca, estará lá? Não.

Algum petisco precioso preparado pelo Celsão, na Adega Tudo do Mar, em Marechal Hermes, vai estar? Não.

Então, meus poucos mas fiéis leitores, eu vos digo:

01) que bom que não estejam no livro os verdadeiros butecos, eis que assim ficam livres da horda de otários que sai atrás das dicas ainda mais otárias, poluindo os autênticos ambientes;

02) que bom que eu posso verificar, mais uma vez, que é um acerto cada porrada que eu dou nesses bares-mentira que, seguramente, estarão entre os escolhidos pelo "mais rigoroso pesquisador do assunto na cidade".

E pra terminar: quem gosta de buteco - eu gosto, o Simas gosta, o Szegeri gosta, o Bruno Ribeiro gosta, o Borgonovi gosta, o Pratinha gosta, o Rodrigo Folha Seca gosta, só pra citar uns poucos - entra num buteco, bate o pé, reclama, pede uma Brahma, pede uma comida, bebe, come e conversa até esquecer da hora. Não fica de bloquinho na mão pesquisando porra nenhuma, que isso é coisa de otário. O que dá, convenhamos, cores de coerência a tudo isso.

Até.

30.10.06

UM SENHOR SÁBADO

Quando eu começo escrevendo "UM SENHOR SÁBADO" não estou mentindo. Conforme eu previra, leiam aqui, o Rio foi mais Rio que nunca na tarde de 28 de outubro, quando Pratinha e Simas comemoraram seus aniversários cercados de amigos, e foram muitos amigos, de muita música, muita bebida e muita festa. Exatamente como ambos merecem. Eu posso dizer, sem medo do erro, que o Buteco arrastou praquela sagrada esquina da Rua do Ouvidor com a Travessa do Comércio, sem contar, evidentemente, com a minha Sorriso Maracanã, o Fefê, a Betinha e o Flavinho, o Fraga e a Renatinha, o Bruninho, a Lelê Peitos, a Manguaça e a Fernanda, a Guerreira, e o Vidal.

a mesa dos músicos

Bem diante da Livraria Folha Seca, a livraria do meu coração, comandada pelo Rodrigo e pela Dani, com o grande Bruno segurando as pontas durante a festa, Pratinha e Simas receberam, de braços e corações abertos, uma multidão de amigos que se embebedou, literalmente, de Rio de Janeiro, de samba, de choro, de cerveja e de chope. Com exceção do Simas que, tendo recebido de presente, de mim, uma garrafa de dois litros da batida de maracujá feita, na manhã do próprio sábado, pelas mãos santas da Terezinha, do Rio-Brasília, deu conta do presente inteiro ali mesmo naquelas calçadas.

Simas, eu, Rodrigo e Bruninho

Para não cometer algumas injustiças omitindo um nome ou outro, deixo de tentar o exercício de memória que me trairia. Mas foi um puta prazer encontrar por lá Zé Sergio Rocha, Alfredinho do Bip-Bip, Helion Póvoa, Moacyr Luz, Marluci, Janir, Pedrinho Amorim, Cláudio, Edmundo Souto, Cid Benjamin, Ari do Simpatia, Tomaz, Jorgito, Maria Helena (que fez as fotos), Leal, Loredano, Mussa, Felipe Barros, Guilherme Sá, Gabrielzinho, Rogério, Evelin, Candinha, Nando, Marcelo Moutinho, Mariana Blanc, Marquinhos Presidente, gente que não escondia a satisfação pelo encontro e pelo momento mágico vivido no Centro da cidade, num sábado de céu azul, gravando, definitivamente, uma belíssima página na história carioca.

Fraga e Moacyr Luz
Simas, Pratinha e Alfredinho do Bip-Bip
Pratinha, Tomaz, Simas e Nando
eu, Dani e Alfredinho do Bip-Bip
Nando, Helion Póvoa e Rodrigo
Rodrigo e eu

Como eu já disse, teve choro, teve samba, teve partido-alto (num hilariante desafio entre o Simas e o Pedrinho Amorim), e quando a noite se fez presente, partimos, num bonde mínimo, em direção ao Galeto Columbia, na minha mui amada Tijuca, onde erguemos os copos ao humor, ao Rio de Janeiro, antecipando a festa da democracia de ontem, quando a esperança deu as mãos à certeza de que o povo brasileiro soube fazer a escolha certa.

Até.

29.10.06

EDIÇÃO EXTRA DE DOMINGO

Vocês que acompanham a trajetória do Buteco sabem que raramente, mas muito raramente, escrevo aos domingos. Acontece que estou na casa da minha mui querida Sônia, mãe dos não menos queridos Manguaço e Manguaça, já que fui convidado para um domingo especial: como voto numa escola aqui do lado, cheguei para o café da manhã, estico para o almoço e para a comemoração da vitória do Lula, que se anuncia. E cheguei com 13 rosas vermelhas e brancas, camarões cinzas, jiló e alho pro tira-gosto.

Breve pausa: amanhã lhes conto sobre a portentosa festa do Pratinha e do Simas, ontem, na Rua do Ouvidor.

Mas eu cheguei e veio a mim o Manguaço, antes mesmo do bom dia:

- Você jé leu a coluna do Jota de hoje?

Não, eu não havia lido.

Eis, meus poucos mas fiéis leitores, a barbaridade cometida pelo homúnculo. Ainda sem minha câmera digital, transcrevo a imunda nota, carregada de preconceito, mau gosto e mentira:

"VAI UM DEDINHO AÍ?

O bar Escondidinho, no final da Ataulfo de Paiva, no Leblon, aproveitou o tititi em torno da petista que arrancou numa mordida um pedaço do dedo de uma tucana, no Jobi, para lançar novo prato: "dedinhos a vinagrete", lingüicinhas finas que têm saído como pão quente."


Notem que nojo. Garantindo o jabá citando dois bares de merda no Leblon, o Jota mente quando inverte (e eu duvido que tenha sido sem querer) agressora e vítima, a verdadeira história pode ser lida aqui. E, o que é pior, faz propaganda de uma idéia que vai na contramão do bom humor carioca. Trata-se de humor negro da pior categoria, o que dá, de certo modo, coerência a tudo: o Jota é tétrico, o bar citado é tétrico, a sacada dos donos da bosta é tétrica e tétrica é a clientela que pede "dedinhos a vinagrete".

Dedinhos nos cus deles, ó!

Até.

27.10.06

ONDE O RIO É MAIS RIO

Que o Rio de Janeiro é uma cidade generosa apesar de Garotinho, Rosinha, Bolsonaro, Picciani e cia., todo mundo sabe (todos sem o negrito, que não merecem). Que o Rio de Janeiro é uma cidade que sobrevive a violências como a entrega da medalha Pedro Ernesto a uma criminosa, também. Mas o Rio é mais.

O Rio, que é o Rio que é graças a cariocas de verdade, é, literalmente, uma cidade de braços abertos sobre a Guanabara, apontados para a zona norte, para a zona oeste, para a zona sul, para o subúrbio, onde, como disse o Chico Buarque, não tem brisa, não tem verde-azuis, não tem frescura nem atrevimento. O subúrbio não figura no mapa e no avesso da montanha, é labirinto, é contra-senha, é cara a tapa. Citação feita, vamos em frente.

Simas e Pratinha no Rio-Brasília, 30 de setembro de 2006

Amanhã, 28 de outubro, faz anos o Pratinha, esse gênio da raça. No dia 02 de novembro faz anos o Simas, um "legítimo finadista", a expressão é dele. Como são membros do mesmo exército - o meu exército também -, comemorarão, amanhã mesmo, as duas datas.

E como são generosos, como a cidade, e como são grandes, como as nossas esperanças que não cessam nunca, farão uma Festa, maiúscula mesma (não se trata de erro de digitação), na mais carioca das ruas do Centro da cidade, a Rua do Ouvidor, bem em frente à mais carioca das livrarias, a livraria do meu coração, a Folha Seca, entre a Primeiro de Março e a Travessa do Comércio.

Vai ter choro, vai ter samba, vai ter cerveja, vai ter chope, e será excelente oportunidade para que vocês possam verificar, in loco, que eu sou preciso do início ao fim quando digo que o Pratinha e o Simas são dois sujeitos que dão mais graça à vida de quem os conhece.

Trata-se, portanto, de um convite aberto a todos vocês, meus poucos mas fiéis leitores.

Não me venham na segunda-feira com chorumela nhém-nhém-nhém dizendo que eu não avisei a ninguém.

Ergo, desde já, antecipadamente, um brinde a esses dois que, a despeito de conhecê-los mais a fundo há pouco tempo, já figuram na minha lista de preferidos.

Até.

26.10.06

AS VANTAGENS DOS CONFRONTOS

Eu disse, recentemente, quando declarei, de público, de pé no banquinho imaginário do Buteco, meus votos no primeiro turno das eleições e meu voto em Lula nesse segundo turno que se aproxima, que uma das vantagens desse segundo turno é, justamente, o que emerge do confronto direto entre apenas dois candidatos. Disse eu, naquela oportunidade: "O segundo turno tem inúmeras vantagens - e mesmo tendo votado em Lula, confesso que achei ideal essa segunda etapa da eleição presidencial, que veio como a materialização de um gesto simbólico de não entregar carta branca ao atual Presidente da República - e dentre elas a que eu julgo a principal: pôr, frente a frente, como as duas únicas opções, os preferidos do eleitorado.".

Feito esse breve intróito, vamos ao assunto que quero abordar hoje. Fica, o intróito, como digressão necessária para melhor compreensão do que penso.

Estou pensando aqui na maneira ideal de dizer o que eu quero e me vem à cabeça - vejam como ando, vejam como ando! - o Gérson, o Canhotinha de Ouro. Ele tem mania de, em suas explanações durante as partidas de futebol, referir-se aos jogadores como "figura A", "figura B", para que o ouvinte entenda o que ele diz. Vou me valer do mesmo método, até mesmo para não ter que escrever o nome sujo da figura tosca que é o que me move a escrever na tarde de hoje.

Mas vocês entenderão o que quero dizer. Estou confuso, estou confuso, é verdade, mas tudo ficará claro no final. Não entrarei no mérito do gesto da "figura A". Dissertarei, isso, sim, sobre a covardia que se esconde sob o manto da imparcialidade ou mesmo sob a aparente nobreza do gesto de não tomar partido diante de um confronto. Farei nova breve digressão. Disse o Szegeri, quando escreveu o texto que figura na orelha de meu livro (comprem, comprem, comprem!), que não há nada mais gostoso (algo assim, o termo exato me foge e, creiam, não tenho meu próprio livro aqui comigo!) do que brigar por um amigo mesmo quando ele não tem razão. Isso, meus poucos mas fiéis leitores, é de uma beleza e de uma profundidade agudíssimas! Dito isso, em frente.

Um certo dia, bate à porta da "figura B" a "figura A". A "figura A", apresentada à "figura B" por uma terceira figura, pede, implora, roga, esmola mesmo, uma ajuda, uma mãozinha (como diriam os antigos, como eu), alegando - e eu digo isso de mãos dadas com a precisão que me acompanha como sombra inseparável - necessidade, extrema necessidade, pedindo uma oportunidade, um "help" (como diria minha Sorriso Maracanã), e a "figura B", alma de altíssimo quilate, atende o pedido, comove-se com a cena, com a situação, estende as mãos, abraça a nefasta figura com a gratidão que nem os franciscanos têm disponível.

E um dia - mas nada disso importa, vejam bem! - a "figura A", agindo como se tudo fosse planejado desde o princípio, agindo de forma suja, fétida, de uma forma que enoja e causa engulhos, cospe no prato que comeu (a expressão é escrita propositalmente, eis que literal até a alma) e trai - não há verbo mais bem empregado - a "figura B" de maneira torpe. Eis aí, meus caros, a Ingratidão, maiúscula, que nesse exato instante me dá ânsia de vômito, eu que aprendi com meus pais, quando ainda não sabia nem falar, que não há nada mais bonito do que o sentimento de gratidão, que eu nutro e alimento diariamente em nome do amor de meus pais, vítimas também, por tabela, dessas vilanias que infelizmente crescem, vertiginosamente, nesse mundo cada vez mais feio.

Mas se nada disso importa do que vou falar?, ouço daqui a pergunta.

Vou falar da vantagem que tem um confronto estabelecido, por exemplo, depois do gesto sujo da "figura A" contra a "figura B".

É que fica, como no segundo turno das eleições, tudo muito nítido.

E me enojam, também, as demais figuras que eventualmente cercam "A" e "B" e que dizem, com um risinho cínico na cara, aquela frase feita que é característica dos covardes que não tomam posição diante de um conflito: "não quero me meter".

Como - eu me pergunto - não tomar posição diante das evidências?

Como não tomar partido do que é correto, do que tem um passado limpo no que diz repeito a gestos humanitários (não estou exagerando) e não execrar, com toda a força, aquele que joga sujo, premeditado, que não merece um mísero gesto de compaixão?

De pé, diante do balcão, quero dizer a todos vocês - leitores assíduos, visitantes ocasionais, aos que me conhecem, aos que não me conhecem, aos que estão aqui pela primeira vez por um acaso qualquer - que eu, sim, sou guerreiro, disposto a lutar, sempre e até o final, pelo que é justo e pelo que me é caro, pelos meus caras, pelas minhas pessoas, pelos meus amigos. De mim - escrevam! escrevam! -, da minha boca, vocês jamais (dito com ênfase szegeriana) ouvirão esse blá-blá-blá confortável que se confunde - eis a verdade que machuca - com covardia.

É preciso - penso isso com mais certeza a cada dia que passa -, sim, sempre, tomar partidos e marcar posições, nem que seja, apenas, para que tenhamos, depois, quando formos apenas saudade, uma biografia mais bonita.

Até.

25.10.06

AS HISTÓRIAS DO BRASIL CONTADAS PELO SIMAS

O Simas, uma das grandes aquisições do ano de 2006, quiçá de toda a minha existência, e que chegou-me através do Buteco - o que justifica sua existência e minha persistência diária, aqui, diante do monitor -, é, digo isso sem medo do erro, um homem feliz. E digo que é um homem feliz não apenas por causa de sua notória, evidente e visível felicidade ao lado da Candinha, sua mulher. O Simas é um homem apaixonado pelo que faz. É um homem apaixonado pelo trabalho. O que o deixa muito à frente da imensa maioria das pessoas que trabalha enfadada, desanimada, conformada e sem paixão. Vejam se não é.

Simas, em 23 de setembro de 2006

Luiz Antonio Simas é Professor de História, maiúsculo. Na foto, como se vê, ele dá aula, em pleno sábado, para uma platéia atenta, durante um churrasco na casa do Fefê e da Brinco. Quero ser mais preciso. Não dava aula no estrito sentido da palavra, mas discursava, com uma veemência capaz de fazer saltarem as veias do pescoço e de avermelhar, à exaustão, a orelha direita, apaixonadamente, contando histórias envolvendo o General Eurico Gaspar Dutra. Um fenômeno. Tive, naquele exato instante, e digo isso em nome da precisão que me é peculiar, aguda inveja de seus alunos.

E eis que o Simas decidiu, na semana passada - ainda bem! - passar a escrever num blog. E como escreve, o danado! O blog, Histórias do Brasil, é, segundo definição do próprio, "um espaço para falar das histórias do Brasil e dos brasileiros, com heróis, canalhas, vendilhões, mártires, santos, generais, guerrilheiros, malandros, prostitutas, foliões, sambistas, macumbeiros, beatas, imperadores, presidentes, assassinos, suicidas, santos e proxenetas, com muita parcialidade e alguns desaforos". Já está mais-que-indicado por mim, no espaço à direita do menu.

Lendo o Simas, vocês que ainda não têm a sorte de conhecê-lo pessoalmente, hão de entender a razão pela qual apaixonei-me de cara pelo malandro.

Ergo, daqui, de pé, diante do balcão imaginário, um brinde à iniciativa do Simas, que dá vida inteligente à grande rede no Brasil, tomada por muito lixo. Mas é como diz, sempre, esse meu novo irmão: não passarão!

Axé.

Ôpa! Perdão!

Eu quis dizer "até".

É que ando lendo demais o "Histórias do Brasil".

Até.

24.10.06

DUAS NOTAS TRISTES

Como já lhes disse, deixei de assinar O GLOBO. Mas o Jota não deixou de faturar mais um bocado com a nota que publica, hoje, em sua coluneta. Como estou sem câmera fotográfica (acionando a Canon judicialmente), fico devendo a fotografia da prova do crime. Mas eis a íntegra da mesma:

"On te rocks

Dono de seis botecos Belmonte, Antônio Rodrigues abrirá novo bar em janeiro, agora de padrão sofisticado, em Ipanema. Nada de chope. Será especializado em uísque e destilados. Chamar-se-á, numa referência à catedral da boemia Zona Sul nos anos 60 e 70, Antonio´s."

Vejam que lixo, acompanhem comigo. O Jota deu seu jeito de meter, de novo, o nome Belmonte no jornal, e isso para anunciar um outro bar que inaugurará apenas em janeiro. Deu seu jeito de citar o testa-de-ferro dos espanhóis, o Antônio Rodrigues, e de dizer que já são seis as mentiras espalhadas pela cidade sob a grife Belmonte. Mas há mais! Há mais! Não diz, o homúnculo, que da mesma forma que o Belmonte não é o verdadeiro Belmonte, glorioso pé-sujo na Praia do Flamengo que foi comprado, reformado, conspurcado e destruído pelo investidor, o Antonio´s a ser inaugurado em Ipanema não será, jamais, o Antonio´s original. Mas não será esse o peixe a ser vendido mais à frente. Vocês vão ver.

Mas agora, mudando de pato a ganso, ou de pato à vaca - termo mais apropriado para o tema, como vocês verão - quero lhes contar sobre um troço que me deixou envergonhadíssimo, revoltado, indignado, puto da vida. Breve pigarro, um tapa no cigarro no fundo do cinzeiro, e vamos em frente.

Na manhã de ontem, segunda-feira, foi homenageada na Câmara de Vereadores da Cidade do Rio de Janeiro uma mulher de nome Maria Dora dos Santos Arbex (sem o negrito, que ela não merece). Recebeu a outrora valorosa medalha Pedro Ernesto. Vamos fazer breve histórico dessa barbaridade para que vocês possam acompanhar a palhaçada sem precedentes. Maria Dora, recentemente, reagindo a um assalto que sofrera no Flamengo, e portando ilegalmente uma arma de fogo, atirou no homem que tentara assaltá-la e, errando o alvo, acertou sua mão.

Valendo-se de uma absurda regra do Regimento Interno da Câmara dos Vereadores, apenas dois - eu disse dois! - vereadores (um do PFL e outro do PSDB) votaram e aprovaram o requerimento apresentado à Mesa Diretora da Câmara pelo vereador Carlos Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro e irmão do deputado estadual Flávio Bolsonaro, todos três presentes à absurda solenidade, e toda a canalha sem o negrito também. Atentem, por exemplo, para o discurso do fascista vereador:

"Estamos congratulando uma pessoa que cansou de esperar o governo do estado para defendê-la. A medalha não é por ela ter atirado em alguém, mas pelo simbolismo do ato, que externa o sentimento de um povo cansado de tanta violência, sem que os órgãos responsáveis tomem qualquer atitude. É uma pena que o tiro tenha pegado na mão e não no coração, pois seria um vagabundo a menos."

O grifo é meu, evidentemente. Como é meu o adendo: o vereador é apenas mais um que envergonha o cidadão do Rio de Janeiro, mais um Bolsonaro preconceituoso, de extrema radical direita, fascista, e que deveria - se tivéssemos alguém corajoso à frente das instituições públicas - ter, apenas por essa sua fala, cassado seu mandato.

Empolgada com a homenagem, e cercada de fascistas como ela - vocês sabem que esses caras crescem quando juntos - disse o seguinte, Maria Dora:

"Se não tem albergue ou não quer ficar no albergue, então fica no meio do mar. Bota num navio e descarrega longe. Na minha calçada, na minha rua, é que não vai ficar."

Propondo um método utilizado no Brasil durante a ditadura militar, e em outros países da América do Sul, a homenageada não teve um único vereador, uma única vereadora, com coragem suficiente para, de dedo em riste, lhe dizer que as calçadas, as ruas, são do povo, e não sua propriedade, arrogância bastante comum em gente dessa estirpe.

Mas que fazer?, me pergunto.

Até João Ubaldo Ribeiro, que só escreve bosta aos domingos, não por acaso no jornal O GLOBO, veio a público defender essa fascista, que deve responder pelo crime que cometeu.

Como também deve responder pelo crime que cometeu o sujeito que tentou assaltá-la, devo dizer antes que uma canadense qualquer venha bradar contra mim.

Por fim, mesmo sabendo que eu jamais serei indicado para receber a medalha Pedro Ernesto - que não tem nenhum valor já há bastante tempo - quero dizer que, se isso vier a acontecer um dia, eu rejeitarei, com toda a veemência possível, a honraria que foi entregue a essa psicopata.

Até.

23.10.06

SEM ELA

E lá vêm os poetas, de novo, me socorrer. Sem ela, sem amor, é tudo sofrimento, pois ela é o amor que eu sempre procurei em vão. Pra quê tanta luz, luminosa manhã? É demais pros meus anseios. De repente em minha vida, já tão fria e sem desejos, esses festejos, essa emoção...

Dani, primeiro de maio de 2006

Tem dia que é assim. Eu atropelo os conselhos que mandam evitar a exposição em demasia, eu esqueço que basta dizer isso a ela, baixinho, em seu colo, e eu passo a querer mais é pôr a boca no mundo e escrever o mais bonito bilhete de amor, a mais ridícula carta de amor, pública, devassada, visível.

Pode ser que seja fruto da fragilidade pós-bala perdida que estilhaçou o vidro de nossa janela, pode ser que seja em razão de sua volta depois de três semanas de viagem, pode ser que seja conseqüência do susto da notícia de hoje cedo, da morte do pai de uma amiga de muitos anos, pode ser tudo isso junto.

Mas pode ser que não seja nada disso, e seja apenas o amor, vivo, intenso, o amor que não arrefece, o amor que só cresce, o amor que me fez comprar flores para encher a casa na sexta-feira passada, quando fui buscá-la no aeroporto com pressa de adolescente aguardando a primeira namorada.

Pode ser que seja por causa da visão de seus olhos, pequeninos, na noite de ontem, depois de um dia inteiro de cerveja, pedindo colo. Pode ser que seja por causa desse frio na barriga que persiste depois de mais de sete anos vivendo juntos, contrariando as previsões que não me servem, de que quimicamente (estaria comprovado, dizem os tolos sem a minha sorte) essas reações não duram mais do que um ano. Pode ser que seja por causa dessa respiração e desses suspiros que são inevitáveis quando vejo sua fotografia, e daí sinto seu cheiro, e daí eu corro os olhos pro relógio contando as horas e os minutos no afã de encontrá-la e aninhá-la nos meus braços.

Vocês que me perdoem, meus poucos mas fiéis leitores, mas hoje estou num desses dias.

Com butterfly, que é como ela chama esses frios na barriga que me percorrem também a espinha. Com o coração disparado, com uma vontade absurda de dar a ela o sistema-solar e o fundo do mar, a minha caixa de lápis-de-cor, o meu Flamengo, o meu Salgueiro, a Tijuca e o Rio de Janeiro. Com uma estranhíssima vontade de chorar, com uma crescente vontade de atravessar o Alto da Boa Vista e cair em seu colo, o lugar mais seguro do mundo, e beijar a mais bonita boca que jamais existiu, e dar a ela minhas lágrimas, meus soluços, meu amor e minha alma.

Pra todo o sempre, amém.

Até.

20.10.06

COMIGO NINGUÉM PODE

Escrevo tomado de estranhíssimo orgulho, intensíssimo orgulho, diante da tela do computador, que por sua vez fica diante da janela do quarto que dá vista para o céu da Tijuca, onde nasci e fui criado. E pra continuar na linha do samba da vermelho e branco, quando eu morrer levarei comigo, dentro do meu coração, a Tijuca comigo.

bala perdida!!!!!

Entramos hoje, eu e Dani, para as estatísticas! E entramos para as estatísticas, engrossando a fileira dos que têm a inviolabilidade do lar (ôpa!) quebrada por uma bala perdida, essa aí de cima, ó!

Um pequeno ruído fora do comum, PLOCT!, e eis o vidro do quarto, onde dormimos juntos e sonhamos abraçados, com um furo lindo, perfeito, redondíssimo, e o insulfilm fazendo as vezes de pétalas negras em flor no desabrochar da violência, reduzindo o impacto da bala.

São seis horas, ouço daqui - cercadíssimo de igrejas - a Ave Maria, e choro, mas não de medo. Choro, não de piedade de mim mesmo, nem mesmo de piedade da minha garota, que chega hoje à noite de Belo Horizonte, aplacando a saudade que me transforma num ser menor que a bala. Choro, talvez, porque nosso horizonte não é mais tão belo quanto o nome da cidade que ficou mais bonita por uma semana, apenas porque lá estava ela, a mulher que me ensinou a sorrir, a Sorriso Maracanã, o mais lindo e luminoso sorriso do mundo, e que me perdoem todas as moças donas de sorrisos lindos e luminosos, mas jamais iguais ao dela.

Choro, talvez, porque ouço daqui as risadas dos canalhas que odeiam a Tijuca, e que vêm do Canadá, que vêm dos bairros exaltados como chiques e outras merdas, e que vêm dos que enxergam, aqui, o fim do mundo.

Atotô Xapanã! Salve, meus caboclos, Tupinambá, minhas flechas, minha bandeira vermelho e preta, do Flamengo também! Ogum iê patakori, e vamos que vamos que vamos que vamos, que comigo ninguém pode!

Aqui, ó, pra vocês!!!!!

Abraço-me, num delírio, à Dona Hilda, componente da Velha Guarda da Unidos da Tijuca, e canto junto com ela:

"Eu agradeço ao Criador
Na Tijuca eu nunca tive desenganos
Sou feliz como ninguém
Além de ser brasileiro
Sou tijucano também"



E antes que eu me esqueça... De novo... Ô, cambada de invejosos, preconceituosos, mauricinhos e patricinhas... Aqui, ó!!!!!

Até.

19.10.06

UM GESTO POLÍTICO

Notem o que diz o bilhete... "Meu irmão, eu vou brigar por você, sempre! Edu e Szegeri"

para Fernando Toledo

Ontem, muito movido pelo gesto passional do Simas, recente e queridíssimo amigo, decidi fazer algo que vinha ocupando minha cabeça há muitos anos: cancelar, definitivamente, para nunca mais voltar atrás (e esse nunca, mais que nunca, dito com a ênfase szegeriana), minha assinatura do jornal O GLOBO, feita em 1994, na época em que vacas tentavam destruir meu pasto, sem êxito e sem caráter.

Brizolista que sou (eu disse sou), minha ojeriza às Organizações Globo vem, como diria o meu saudoso e eterno Governador Leonel de Moura Brizola, de longe. O nefasto episódio Time-Life, o papel vergonhoso desempenhado durante os anos de chumbo, a participação comprovada no escândalo PROCONSULT que tentou surrupiar votos de Brizola quando eleito pela primeira vez Governador do Rio de Janeiro, a nojenta omissão da TV GLOBO quando da realização dos comícios em prol das eleições diretas, a edição covarde do último debate entre Collor e Lula em 1989, tudo isso sempre me enojou e me fez ser, permanentemente, um leitor e um telespectador mais-que-atencioso quando se tratava de ler, ver e ouvir o que vinha da Vênus Platinada.

Hoje percebo que, por razões que nem eu mesmo consigo explicar, tornei-me assinante de O GLOBO por osmose. Os jornais cariocas - vale dizer que o povo carioca é o que mais lê jornais em todo o Brasil -, e isso hoje é ainda mais evidente e mais grave, tornaram-se um pastiche só, salvando-se um ou outro jornalista, ora de um, ora de outro jornal. Ocorre que O GLOBO era - e ainda é - o mais importante jornal do Rio de Janeiro, e acho que por isso, e graças a uma preguiça condenável, eu até ontem figurava no rol de seus assinantes. Figurava, como bem disse.

Impulsionado pelo corajoso gesto do Simas, enojado com a crônica que o Arnaldo Jabor (sem o negrito, que ele não merece) publicou naquele detestável Segundo Caderno (nem a Regina Duarte foi capaz de campanha tão sórdida pelo medo em detrimento da esperança e da verdade), tomei, ontem, no final do dia, a decisão que hoje - é incrível como é bonito e comovente perceber o que nos causa a tomada de um gesto eminentemente político - me alivia de forma quase que inexplicável.

Pediu-me, a supervisora Ieda, que me ligou ontem minutos após meu desligamento por telefone com um dos atendentes do jornal, que enviasse para um email que me forneceu, a lista das razões que me levaram a essa decisão. Decisão que - disse-me ela - tem sido uma triste constante nestas últimas semanas, em que o jornal - basta uma passada de olhos na seção de cartas dos leitores - assume, escancaradamente, uma posição parcial e desonesta, na contramão do desejo do povo brasileiro.

Eis, meus caros, a íntegra do email que escrevi possuído:

"A pedido da Sra. Ieda, que gentilmente atendeu-me hoje quando cancelei, por telefone, minha assinatura, venho pela presente mensagem dirigir-me a vocês para - a pedido dela, repito - explanar as razões de meu desligamento definitivo deste jornal.

Tudo começou em 19 de março de 2005 - sou assinante bem antigo - quando flagrei nojento e explícito caso de plágio nas páginas do destetável caderno ELA. Vejam aqui:

http://butecodoedu.blogspot.com/2006/06/acr-e-um-plgio.html

Mandei email para os editores, para a própria plagiadora, e ninguém me respondeu.

Depois, seguem-se VINTE E DOIS episódios repugnantes, tendo outro jornalista, dono de coluna no jornal, como protagonista de notas fétidas, preconceituosas, voltadas para um público ao qual não pertenço, seguem todas imediatemente abaixo.

01) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/03/p-sujo-fashion.html
02) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/04/e-prossegue-praga.html
03) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/04/eu-visionrio.html
04) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/05/jota-o-incansvel.html
05) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/05/os-chefs-e-os-butecos.html
06) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/05/gentskrta.html
07) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/05/jota-alade-e-chico.html
08) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/06/jota-mentiroso.html
09) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/06/jota-x-9.html
10) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/idi-jota.html
11) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/jab-com-jota.html
12) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/ranking-do-jota.html
13) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/jota-de-frias-mantida-fria.html
14) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/inaceitvel.html
15) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/farra-continua.html
16) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/07/eu-sabia.html
17) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/08/jota-ataca-outra-vez.html
18) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/08/jota-corretor.html
19) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/08/os-investidores.html
20) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/09/ter-o-jota-enlouquecido.html
21) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/09/o-patro.html
22) http://butecodoedu.blogspot.com/2006/10/ele-s-pensa-naquilo.html

Some-se a isso, Srs., a paciência que tive que ter durante a Copa do Mundo lendo as colunas de jornalistas que não sabem NADA de futebol, e que atentaram contra o leitor inteligente ávido por notícias ligadas ao maior torneio de futebol do mundo.

Some-se a isso, Srs., ter que aturar Joaquim Ferreira dos Santos escrevendo às segundas-feiras, Arnaldo Jabor às terças-feiras (ontem, especialmente, esteve nojento, e senti-me ofendido quando ele referiu-se como ignorantes aos que votam em Lula, como eu), Arnaldo Bloch, um bobo, Artur Dapieve, que nada tem a acrescentar, Artur Xexéo, chato, repetitivo, cansativo, e figuras pífias que assinam cadernos como o ELA ou seções imbecis dentro da Revista RioShow.

E some-se a isso, Srs., e eis a gota d´água, a cobertura parcial, desonesta, fascista, preconceituosa e venal das eleições 2006.

Como, infelizmente, fui informado pela atendente Ieda que, por obra do sistema de assinatura mensal, receberei o jornal até 12 de novembro de 2006, venho pela presente dizer que (01) já requeri o cancelamento definitivo da assinatura a partir daquela data, (02) até lá o jornal servirá, apenas, para que o Pepperone, meu cachorro vira-lata, faça xixi e cocô nas páginas de O GLOBO, sendo uma tremenda sorte dele o fato de não saber ler e, finalmente, (03) que farei intensa propaganda entre os meus, que não são poucos, para que sigam minha decisão de deixar de assinar este jornal que não cumpre, minimamente, o dever de informar, mas sim, diariamente, o papel de torcer os fatos, manipular a verdade, exaltar a podridão que destrói a cidade do Rio de Janeiro e assola o País, enganar o leitor (ou tentar enganá-lo), mentir, mentir, mentir, a serviço das forças mais destrutivas que este País conhece.

Espero, Srs., desta vez, receber ao menos uma resposta, mínima que seja, eis que, JAMAIS, mesmo diante de minhas intensas manifestações de descontentamento por email, recebi qualquer resposta.

Atenciosamente,

Eduardo Goldenberg"

Ontem à noite mesmo, contando este episódio a meu amado pai, disse-me ele:

- Meu filho... Eles não estão nem aí pra isso... São milhões de assinantes...

Quero crer que meu pai se equivoca.

Eu sou apenas UM indivíduo. E que a fila aumente.

A propósito: a imagem que encabeça este texto é a do bilhete que escrevi, em meu nome e em nome do Szegeri, e que pus, cheio de orgulho, no barquinho branco de madeira que desceu o leito do Rio Maracanã, no dia 17 de agosto de 2005, levando as cinzas do meu irmão Fernando Toledo. Lembrei demais dele ontem, quando desliguei o telefone com a atendente do jornal.

Até.

17.10.06

SZEGERI E A RAINHA DO FREVO

Eu sempre que falo do Szegeri, meu irmão paulista, faço questão de dizer que ele chora mais que bebê recém-nascido com cólicas olímpicas. Se bem que, em nome da precisão do início ao fim que me caracteriza, devo dizer que depois que conheci o Simas, outro emotivo crônico, não tenho mais certeza de que é ele, o Szegeri, o maior chorão que conheço. Papai é um que, por exemplo, sempre que falo do cara, manda essa:

- Pai, ontem à noite eu falei com o Szegeri e ele me disse que...

- Ele chorou por que dessa vez?

Vão tomando nota da fama szegeriana.

Mas se eu, por um lado, não sei mais dizer com certeza quem chora com mais freqüência, tenho, depois de cinco dias em sua companhia, uma certeza incontestável: ninguém, nunca, ao menos diante de mim, chorou por motivo tão banal, ou, se eu não quiser usar a palavra banal, que pode soar pejorativa demais para um homem de coração tão bom quanto o meu siamês, por motivo tão inusual, transformando seu gesto num quadro hilário dentro daquele delicioso domingo, quando comemorávamos o aniversário da Dani.

A seresta corria solta.

Violão, flauta, as pastoras Railídia e Roberta Valente cantando lindamente, até que o Szegeri pediu:

- Rui! Dó maior, por favor!

Rui, violão de ouro, fez o acorde.

E começou, meu irmão, a cantar:

"Dora, rainha do frevo e do maracatu
Dora, rainha cafuza de um maracatu
Te conheci no Recife
Dos rios cortados de pontes
Dos bairros, das fontes coloniais...
Dora, chamei
Ô Dora!... Ô Dora!"

Dora

Foi quando veio, em sua direção, a Dora, a cachorra de seu cunhado, o Capitão Leo Golla, que lá passava o feriado em razão da viagem do dono.

Já soluçando, o Szegeri continuou:

"Eu vim à cidade
Pra ver você passar
Ô Dora...
Agora no meu pensamento eu te vejo requebrando
Pra cá, ora prá lá
Meu bem!"

Dora abanava o rabo freneticamente, e meu irmão paulista chorava fungando dentro da orelha direita da cachorra.

"Os clarins da banda militar, tocam para anunciar
Sua Dora, agora vai passar
Venham ver o que é bom
Ô Dora, rainha do frevo e do maracatu
Ninguém requebra, nem dança, melhor que tu!"

Os presentes, incrédulos, assistiam à cena, até que o Szegeri, já no chão, e já agarrado à peluda cachorra, ambos imundos, bateu o telefone pro Capitão Leo:

- Leo? Eu nunca - NUNCA!!!!! - nunca mais te devolvo a Dora...

E danou de fungar.

Até.

COM A FORÇA DO POVO

Meus poucos mas fiéis leitores hão de saber que falo a verdade. Mantive-me, durante toda a campanha eleitoral, em rigoroso silêncio sobre o assunto. A ducha de água fria que a sucessão de decepções provocou ao longo dos quatro anos de governo Lula esfriou, de fato, o desejo de vestir, por aí, camisas de qualquer cor, bandeiras de qualquer partido, e foi em silêncio, comovidíssimo, que votei no dia primeiro de outubro de 2006 em João Sampaio para Deputado Estadual, em Miro Teixeira para Deputado Federal, em Milton Temer para Governador, em Jandira Feghali para o Senado Federal e em Lula para Presidente da República.

Estamos, agora, a pouco menos de quinze dias da eleição para o segundo turno. Concorrem Lula e Geraldo Alckmin, que vai sem o negrito, que ele não merece. Por mais que alguns insatisfeitos defendam o voto nulo ou o voto em branco - lamentável caso da Senadora Heloísa Helena - é fato que o Senhor Nulo e o Doutor Branco jamais ocuparão o cargo de Chefe do Poder Executivo. O segundo turno tem inúmeras vantagens - e mesmo tendo votado em Lula, confesso que achei ideal essa segunda etapa da eleição presidencial, que veio como a materialização de um gesto simbólico de não entregar carta branca ao atual Presidente da República - e dentre elas a que eu julgo a principal: pôr, frente a frente, como as duas únicas opções, os preferidos do eleitorado.

E são eles o Lula e o Alckmin, esse último um fantoche nas mãos podres de FHC (também sem o negrito). Lula e seu projeto para o Brasil, Alckmin e seu projeto para o Brasil. E eles são - os projetos - tão diferentes, tão díspares, que eu considero, particularmente, uma covardia mais-que-reprovável essa confortável postura que põe, os dois, na mesma caçamba. Mas não vou tomar-lhes mais tempo, até mesmo porque eu não me sinto capaz de racionalizar meu voto e, conseqüentemente, convencer "a" ou "b" de que a minha escolha é que é a certa. Como em tudo na vida, decido meu voto por paixão, se bem que devo lhes dizer que tenho, sim, sempre, minhas razões para tomar essa ou aquela direção. O que quero hoje, mesmo, é dar espaço - ainda que modestíssimo, e desde já peço aos amigos que espalhem esse link na medida do possível - a um episódio que aconteceu na madrugada de segunda-feira no Jobi, no Leblon. Aliás, não poderia ser em outro lugar. Quando eu bato - e não bato pouco - no Jobi, no Leblon, se não estou querendo com isso generalizar, afinal tenho amigos queridos morando por lá, estou querendo dizer que são, o Jobi e o Leblon, ninhos de pernósticos da pior espécie, fascistas asquerosos que merecem meu mais profundo desprezo.

Estranhamente - ou nem tão estranhamente assim, afinal nossa imprensa é vendida, salvo raríssimas exceções - ninguém deu a notícia. Uma modesta e mínima nota consta da coluna de Ancelmo Gois, n´O GLOBO de hoje, com o título "Canibalismo", dando conta da barbaridade que cresce, de forma assustadora, Brasil afora.

Leiam aqui, no Vermelho Online, site que eu já recomendo há anos, a íntegra da matéria cujos trechos transcrevo:

"Dois episódios de violência urbana motivada por razões políticas acrescentaram um ingrediente novo e preocupante à disputa eleitoral de 2006.

Um dos episódios ocorreu na madrugada desta segunda-feira, no bairro do Leblon, Rio de Janeiro, onde quatro militantes petistas foram espancados por uma turma de cerca de dez pessoas que se identificaram como apoiadores do candidato à presidência, Geraldo Alckmin.

A fúria foi tanta que uma das agressoras - não conseguindo acertar os olhos da publicitária Danielle Correia Tristão - arrancou-lhe um dedo à base de dentadas. ''Segundo um médico do Hospital São Lucas, a mordida foi muito violenta e decepou até o osso'', relatou o marido de Danielle, Juarez Brito de Vasconcellos, ao site do PT. ''O médico disse que só em casos de mordida de pittbull tinha visto coisa parecida.''

Principal vítima do ataque, Danielle teve de amputar parcialmente o dedo anular da mão esquerda. Ela e o marido fizeram boletim de ocorrência, acionaram um advogado e programaram exame de corpo de delito. Dois amigos do casal o acompanhavam, sendo também alvos de hostilidades e agressões.

(...)

Depois de participarem de uma caminhada da campanha Lula pela manhã e de irem à tarde para a praia, Jurez e Danielle encontraram os amigos e se dirigiram ao bar Jobi. O casal vestia uma camiseta com a inscrição ''Lula, Sim!'' - o que fez cerca de dez apoiadores de Alckmin começarem a xingar e destilar ódio, tentando impedi-los de permanecer no estabelecimento.

Quando se sentaram, os petistas sofreram mais ameaças e provocações. ''Eles atiravam bolinhas de papel e nos chamavam de ladrões, de corruptos, de bandidos, de filhos da puta. Impressionante o ódio que saía dos olhos daquelas pessoas'', comenta Juarez. Sentindo o clima anunciado de terror, eles decidiram antecipar a conta e deixar o bar à 1 hora da madrugada. ''Tinha um senhor de uns 60 anos que ameaçava jogar um prato em cima da gente. Eles iam linchar a gente.''

Próxima à porta, porém, uma das agressoras pegou um adesivo de Alckmin e o esfregou no rosto de Danielle. Outra mulher atirou para longe o chapéu de palha usado pela petista. O grupo tentou correr até o carro, mas as agressões se multiplicaram, como relata Juarez: ''De repente, alguém me jogou no chão. Vieram outras pessoas. Foi uma grande confusão. Quando consegui me desvencilhar, já tinha sangue para todo lado''.

(...)

Outro episódio, igualmente chocante, ocorreu no domingo em João Pessoa, na Paraíba. Desta vez o jornal local, Correio da Paraíba, registrou o episódio.

Segundo o jornal, o técnico em eletrônica Tibério Modesto, de 21 anos, militante do PMDB, foi agredido a socos e pontapés, teve o aparelho celular roubado e o parabrisa do carro quebrado durante carreata do PSDB realizada na tarde de domingo (15), no bairro de Mangabeira. A esposa do Tibério, Fânela Peres, e sua filha, de apenas nove meses de idade, também foram agredidos. O bebê ficou com hematomas em um dos braços que, segundo ele, foram causados pelos participantes da carreata.

(...)

A causa do vandalismo, de acordo com Tibério, foram adesivos do candidato José Maranhão e do presidente Lula que estavam afixados em seu carro. O militante peemedebista contou que vinha da praia com a família e pretendia visitar um primo que mora em Mangabeira."

Isso é que eu acho, sinceramente, comovente, se pensarmos grande.

De um lado - e não me acusem de valer-me de discurso ultrapassado, porque isso nunca vai acabar - a elite rancorosa, a direita raivosa, a escumalha, detrito de séculos de poder concentrado nas mãos dos que não admitem o novo, os preconceituosos que, babando de um ódio incomensurável, lançam em direção ao Presidente da República e candidato à reeleição que não tarda, os mais putrefatos dedos acusando-o de não ter estudado, de não ter berço, de não ter um dedo, o que seria - disse-me uma porca um dia desses - fruto de sua desatenção na fábrica em que trabalhava: eles são os eleitores de Geraldo Alckmin.

Lula em campanha em 2006

De outro lado, diz bem o slogan da campanha de Lula, o povo.

Por isso anseio pela chegada do dia da eleição.

Para que, de novo, e dessa vez com mais orgulho, com forte convicção, eu possa cravar o 13 na urna eletrônica, chorando mais uma vez, provavelmente, gritando por dentro: "Lula de novo, com a força do povo".

É isso, definitivamente é isso, o que eu quero.

Porque eu não tenho a menor dúvida - a mais pálida - de que é o melhor para o Brasil.

Lula em campanha em 2006

Até.

PS: ah, sim. A título de curiosidade, vasculhem depois alguns blogs, de uns fanáticos anti-Lula (não conheço um único cidadão que goste do Alckmin), e vejam se eles fazem mínima menção ao lamentável episódio tipicamente fascista, perigosíssimo, parte, apenas, de um movimento ainda mais perigoso e negro que pretende tornar a reeleição de Lula ilegítima, apenas e tão-somente porque essa gentalha que arquiteta esse movimento não tolera o que vem do povo. Não custa vasculhar. Assim, vamos sabendo, nitidamente - eis a beleza de um segundo turno - quem é quem.

16.10.06

EM SAMPA

(pra Stefânia e pro Szegeri)

Depois de quase uma semana fechado, reabro hoje o Buteco.

Fui, na quarta-feira, conforme anunciei, na véspera do feriado de 12 de outubro, ao encontro da minha Sorriso Maracanã, que estava a trabalho, desde a segunda-feira passada, em São Paulo. Por diversas razões de ordem prática, já que a minha garota ainda teria (ainda tem...) uma semana de trabalho pela frente fora do Rio de Janeiro, decidimos passar o final de semana em solo paulistano, o que significa dizer que foi lá que comemoramos o aniversário da mulher que me ensinou a sorrir.

Breve pausa para uma digressão mínima.

Dani, quando viaja, me deixa aqui com o coração do tamanho da gema de um ovo de codorna. Sou daqueles dependentes, em todos os sentidos possíveis e imaginários, e vê-la fazer as malas é algo tão angustiante quanto subir, devagar, a escadinha que leva o condenado à forca. Mas dessa vez foi diferente.

Dani ficaria na nossa casa em São Paulo, o que significa dizer que ficaria na Casa Vermelha, dos meus irmãos Szegeri e Stê. Dessa vez, então, a angústia não teve vez. Primeiro porque eu sabia, quando de sua partida, que em pouco mais de 48h estaríamos juntos outra vez. E segundo porque, estando Dani entre meus irmãos queridos, estaria bem, estilo melhor-impossível. E assim foi.

Não foi tão mínima a digressão, mas vamos em frente.

Cinco dias em São Paulo possibilitaram passeios nunca dantes feitos, conhecer bares novos, restaurantes novos, (con)viver mais de perto não só com esses dois, a quem amo a cada dia mais, mas mais de perto com gente da melhor qualidade como a Roberta Valente, o Erik e a Dani (que nos acompanharam no passeio ao Museu da Língua Portuguesa), beber descompromissadamente com o Bruno Ribeiro, que nos deu a honra de se despencar de Campinas para passar o sábado conosco (aliás, seu relato é preciso do início ao fim), ir mais uma vez à roda de samba dos Inimigos do Batente no Ó do Borogodó, disparado o melhor programa de São Paulo, e, finalmente, comemorar o aniversário da minha amada entre amigos, na Casa Vermelha.

Eu não vou me arriscar a nomear um por um, mas foram muitos os queridos que foram até lá, provar da famosa feijoada do Szegeri. Do Rio foram o Dalton, a Moniquinha, a Fumaça, o Alex Justo, e as fotos das efemérides são capazes, mais do que eu, tantos os sorrisos flagrados, de dimensionar o quão bonita foi a festa.

De pé, cotovelo apoiado no balcão do buteco imaginário, cansadíssimo da maratona que foi a estadia, ergo um brinde à Stefânia e ao Szegeri, que têm, por tudo (já tinham, é verdade), minha eterna gratidão.

Até.

10.10.06

RECESSO

O Buteco entra, hoje, em mais que merecido recesso.

Até a próxima segunda-feira, dia 16 de outubro, estarei batendo ponto (eu digo logo que, aqui, o detestável gerundismo é bem aplicado, antes que me encham o saco!) em solo paulistano, onde encontrarei, além da minha mais-que-bem-amada Sorriso Maracanã - que faz anos no dia 15 de outubro, domingo - meus queridíssimos amigos que infelizmente não moram aqui.

O recesso, aliás, é belíssima oportunidade para vocês lerem, ou relerem, as entrevistas que emplaquei aqui no Buteco.

A primeira, contando com a participação dessa saudade chamada Fernando Toledo, com Fausto Wolff, aqui.

A segunda com Aldir Blanc, aqui.

A terceira com Moacyr Luz, aqui.

E a quarta com Wilson Moreira, aqui.

Até a volta!

9.10.06

LEBLON, LEBLON, LEBLON

Confesso, quase-triste, que nem eu mesmo estou agüentando mais o Buteco. É que o Jota, de tanto insistir no cumprimento do papel de corretor de imóveis no Leblon, de bajulador dos bares-mentira que se espalham por aí, acaba me deixando sem opção: eu tenho que continuar a bater, a marcar posição, a bater mais, e isso, eis o que me entristece, cansa.

Faço breve digressão.

Dia desses, mesmo, o Arnaldo Bloch, que também escreve para o Segundo Caderno de O GLOBO, escreveu o seguinte, e eis a transcrição dos mais elucidativos trechos:

"Antes de tudo: eu amo o Leblon. (...) O Leblon anda esquisito. (...) O Florentino fechou. O Caneco 70 foi abaixo. Vários botequins legais sumiram, como o Final do Leblon, na Dias Ferreira, (...). A Dias Ferreira, aliás, está se transformando num tipo de rua chique sem qualquer afinidade com o bairro. (...) Dias Ferreira deveria ser Leblon. Mas não é. O que se vê, com as honrosas exceções (..), são uns restaurantes de fachada alta, cozinha afetada e freqüência bicuda, gente que nem múmia, segurando penteado, secando maquiagem, espirrando fashion. Tem um sapateiro metido a besta que você olha e acha que é o futuro. Mas vá pedir pra colar uma tira de sandália... é marra que não se vê nem em Paris! Vontade de sair correndo, pegar um circular pro Centro, entrar na oficina mais furreca e gentil. De resto, na Dias e no Baixo em geral e além, multiplicam-se as cadeias botequineiras de alta rotatividade, público que não deixa marca, garçons sobrecarregados que mal conhecem clientela. No Triângulo do Jobim, imperam informalidades formatadas na Conde, pão de queijo seco na saudosa Plataforma, pizzas adolescentes da Cobal. OK, melhor investir em botequim do que em fast food. Mas fala-se aqui de estilo. De saber viver. De brisa nas idéias. De alma — mais que forma ou bolso — requintada. E de papo bom. E o papo anda chaaaaato que dói. (...)"

Pois bem.

O que fiz eu?

Mandei gentil email para o Arnaldo Bloch. Ei-lo:

"Caro Arnaldo: Sugiro, sem com isso pretender tomar seu tempo, que você dê uma xeretada em meu blog, o Buteco do Edu, em www.butecodoedu.blogspot.com e dê, lá, uma xeretada no que eu chamo atentados do Jota, seu colega de redação (se é que há colegas nas redações cibernéticas hoje em dia). Você vai entender, presumo, o por quê do sucesso que fazem esses bares-mentira que estão destruindo - se já não destruíram - o Leblon. O Leblon anda esquisito, Arnaldo, muito por causa disso. Dessa bajulação desmedida, escancarada, e dessa pose, dessa pernóstica e nojenta pose, que passeia pelas calçadas do outrora delicioso Leblon. Ah, sim. Eu também amo um bairro: a Tijuca. Forte abraço, e tô nessa briga contigo. Edu"

Ele me respondeu?

Sim.

Eis a resposta:

"prometo xeretar. abrs"

Que beleza! Que gentil! Que atencioso!

Depois reclama.

Abro o Buteco hoje, de novo, apenas para deixar com vocês duas notinhas publicadas na coluneta do Jota. São essas aí.

nota publicada no Segundo Caderno de O GLOBO de 09 de outubro de 2006
nota publicada no Segundo Caderno de O GLOBO de 09 de outubro de 2006

É isso, meus caros. E é isso, Arnaldo Bloch.

Fica o Jota exaltando o Leblon, como único bairro possível.

E vai o Leblon sendo destruído, aos poucos, e só eu gritando daqui.

Até.

7.10.06

ELE SÓ PENSA NAQUILO

E cá estamos nós, abrindo o Buteco na manhã de sábado, que o Jota não dá descanso: ele só pensa naquilo. Sua coluneta de hoje, do início ao fim, fala sobre a entrega do Prêmio RioShow de Gastronomia, excrementoso concurso promovido pelo jornal O GLOBO sobre o qual falei, de leve, no dia de ontem, leia aqui.

O título da matéria é, justamente, "Eles só pensam naquilo". E a primeira fotografia que ilustra o troço, mostra Christophe Lidy, do Garcia & Rodrigues, no Leblon evidentemente, posando em frente a um outdoor da Academia da Cachaça, no Leblon evidentemente. Vocês ouvem daí o barulhinho da caixa registradora? Vamos em frente.

nota publicada no jornal O GLOBO de 07 de outubro de 2006

Vamos à análise desse palpitante depoimento de Roberta Sudbrack, a ex-cozinheira de FHC no Palácio do Planalto, autora de um impressionante livro de alta gastronomia canina (duvida? clique aqui!), e que cobra R$190,00 (cento e noventa reais), por pessoa, o jantar em seu restaurante, assim anunciado em seu site:

"Será muito bom ter você em nossa casa. O nosso objetivo é lhe proporcionar inesquecíveis experiências gustativas. Você irá apreciar uma cozinha autoral em ambiente de estilo e charme. A proposta não é de um restaurante - pelo menos no seu conceito tradicional - mas de algo mais, que certamente dará vida nova à velha concepção. Uma forma inventiva de fazer gastronomia. Um lugar de emoções e lembranças. Um pólo de atração culinária com serviços personalizados, trocas de conhecimentos e boa opção de compras de produtos. Se você aprecia o gosto e quer algo realmente especial, este é o lugar certo."

E é essa a mulher que, em depoimento à coluneta do Jota, diz que é pela simplicidade sempre. Ah, sim. E notem que no pé da nota, o incansável jornalista (tenho que rir sempre que a ele me refiro assim) consegue emplacar o nome de Alaíde Carneiro, do Bracarense, no Leblon evidentemente. Vamos em frente.

nota publicada no jornal O GLOBO de 07 de outubro de 2006

Vejamos agora essa notinha aí de cima. O Jota, achando que inventou uma piada daquelas imperdíveis, cita o Movimento FMI (fomos muito imitados). E diz, na imunda nota, que os sócios do Botequim Informal (olha o som da caixa registradora!), no Leblon evidentemente, acusam o Devassa (de novo! de novo!) de copiar seu mais famoso prato, o Mineirinho, que é feito de lascas (lascas?!?!?!?!?!) de filé com aipim frito, cebola e queijo derretido. E dá voz a dois sócios da rede. Diz Mariano Ferreira: "Fizeram igualzinho". E bate o pezinho o outro sócio, Gustavo Gill: "Ficamos lisonjeados deles copiarem nossos pratos, mas, sinceramente, é um pouco deselegante.". Ponto, parágrafo.

Deselegante? Mas quem são, meu São Sebastião do Rio de Janeiro, os sócios desse lixo para falarem em deselegância? E que barbaridade o Jota escrever um treco desses! Informal, Devassa, Conversa Fiada, esses bares de merda, todos, sem exceção, são cópias uns dos outros, e por sua vez são todos filhotes dos bares paulistas que vêm invadindo a cidade do Rio de Janeiro de maneira olímpica! E pra fechar... Inventivos os sócios do Botequim Informal, hein?! Há quantos anos, São Sebastião, há quantos anos se faz filé aperitivo com aipim, cebola e queijo derretido por cima????? A única novidade que há no tal do Mineirinho sabem qual é? A palavra "lascas". Vamos em frente que tem mais.

nota publicada no jornal O GLOBO de 07 de outubro de 2006

Fechando, então, vamos prestar um bocadinho de atenção ao que disse à coluneta Verônica Dobal. Diz o Jota que ela adora vinhos, mas tem pavor dos enochatos, chamados de "insuportáveis" pela pernóstica.

Eu pergunto daqui, com o cotovelo apoiado no balcão imaginário do Buteco, bebendo cerveja e comendo um filezinho aperitivo: quem são os responsáveis - aliás, os únicos responsáveis! - pela multiplicação dos enochatos? É tão evidente, mas tão evidente, que eu me recuso a responder.

E quer dizer que quem exalta "cozinhas autorais" não é chato? E quer dizer que quem serve "lascas de filé" não é chato? E quer dizer que quem vive de vender vinhos e fica, por aí, chamando seu cliente de "enochato" não é chato?

Tá bom, então.

Bom sábado pra todos.

Até.

6.10.06

COZINHA AUTORAL

Eu detesto essa palavra... "descontruir". Soa-me babaca demais, pernóstica demais, pedante. Mas não é outra a coisa que farei hoje, de pé, orgulhoso, diante do balcão imaginário do BUTECO. E explico.

A revista RIOSHOW, de O GLOBO, traz, como matéria de capa, mais um desses concursos estúpidos que escolhem o melhor isso, o melhor aquilo, como faz também o outrora decente guia Rio Botequim, hoje um verdadeiro vade-mecum de otário, como bem diz o meu irmão Szegeri.

É claro que, por exemplo, o Jobi, no Leblon (evidentemente), foi considerado o bar com melhor comida de botequim. Aliás, e sobre essa categoria (vejam como é nojenta uma "eleição" desse gênero), os jurados, que não entendem porra nenhuma sobre butecos de verdade, escolheram apenas merdas como Belmonte, Conversa Fiada, Devassa, tendo um dos jurados - não lhes direi o nome para não dar crédito a uma azêmola na matéria - escolhido o Esch Café, no Leblon de novo, como o lugar que serve a melhor comida de botequim. É de fazer rir. E muito. Como é de fazer rir o texto que anuncia o prêmio ao Jobi: "Até omelete de brie com presunto de parma (...) servem.".

Mas nada supera a frase-depoimento da ACR, a plagiadora, como provei aqui. No texto que anuncia a vencedora da categoria de melhor chef - Roberta Sudbrack, ex-cozinheira de FHC e autora de um livro nojento de alta gastronomia para cachorros, é isso mesmo!, deve ter sido fruto da experiência durante oito anos na cozinha do Palácio do Planalto, veja aqui - a moça se supera.

O que quer dizer, meu Deus!, da expressão "cozinha autoral" que a moça usa?????

Esses críticos metidos a besta, categoria na qual se insere a insuperável ACR, não têm limite quando o assunto é inventar moda.

Se alguém cozinha, evidentemente que esse alguém é o autor (é péssima a palavra para isso, mas fazer o quê?) da comida.

Mas no Rio-Brasília, por exemplo, que nenhum dos jurados conhece - garanto - os bravos cozinheiros, que seguem as receitas da Terezinha, jamais seriam chamados de autores de uma "cozinha autoral". Como não faz "cozinha autoral", também, o Chico, do glorioso Bar do Chico, na Tijuca. Ainda bem, diga-se de passagem.

E isso porque - me perdoem a ferocidade - cozinha autoral de cu é rôla.

Até.

5.10.06

POEMETO

(pra Dani)

Vocês hão de me perdoar.

Mas é que balcão de buteco também foi feito pra confissões, promessas e juras de amor. E quando ela viaja eu fico assim. Não tem jeito. Por isso, pra Dani, um poemeto.

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Eu não diria que não creio em Deus.

Deixei de pensar n´Ele.

Se bem que, pensando agora,
enquanto escrevo,
acho engraçado o apóstrofo
e o E maiúsculo que pus
sem pensar.

Devo crer. Só que deixei de pensar.

Entre contas a pagar,
as obrigações, o trabalho,
milhões de afazeres,
os amigos, os bares,
meus prazeres,
deixei de pensar em Deus.

Por que - então, eu me pergunto -
rezo todas as noites, contrito,
de um jeito que eu acho até bonito
e também um tanto quanto pagão?

A reza é plagiada.

Mas também - caramba! -
eu não sei rezar.
E rezo em ritmo de samba.

Termino assim:

"Volta
Volta, meu amor.
Quero sentir novamente o seu calor."

Até.

4.10.06

WILSON MOREIRA CANTANDO - II

Como eu disse ontem, depois da entrevista o Wilson Moreira deu de cantar. Nesse vídeo, mais uma vez acompanhado pelo 7 cordas do Pratinha, ele canta "Canteiro de Obra", parceira com Sérgio Fonseca.



"Veio de longe lá do fim da trilha
Lá das quebradas secas do sertão
Matar o corpo no sul maravilha
Que a alma já morreu na arribação

Trouxe a esperança
Que não se envergonha
De não ter tempo de esperar em vão
Pois tudo aquilo que o seu peito sonha
Se concretiza em outra construção

O peão entrou na obra, o peão
O peão entrou na obra
Roda peão, bambeia peão
Roda peão na mão do patrão

O peão só pega a sobra, o peão
O peão só pega a sobra
Roda peão, bambeia peão
Roda peão na mão do patrão

Guarda na mente
Na lembrança esperta
Tanto repente, tanta oração
Dessas mentiras uma coisa é certa
Quanto mais reza, mais assombração

Só pensa um dia em voltar pro norte
Virando a sorte que Deus lhe deu
Quem sabe um dia até mesmo a morte
Seja maior do que o destino seu

O peão entrou na obra, o peão
O peão entrou na obra
Roda peão, bambeia peão
Roda peão na mão do patrão

O peão só pega a sobra, o peão
O peão só pega a sobra
Roda peão, bambeia peão
Roda peão na mão do patrão"


Até.

3.10.06

WILSON MOREIRA CANTANDO - I

Depois da entrevista, Wilson Moreira deu de cantar. Pratinha, com seu 7 cordas, arrebentou acompanhando o Wilson em "Oloan", nessa gravação mais-que-à-vontade!



"Ossan, Ossan,
Oguirê, oguirê
Toda iluminação de Orun
Oloan, Odú

Eu vou pedir licença
E vou ao mar
A claridade do dia
Vai me iluminar, ô ô
Me banhar
Vou mergulhar nas águas
E me purificar
No fundo do oceano

Os caprichos de Janaína
A pureza do mar
Oh! Mãe Rainha Iemanjá"

Até.

2.10.06

ENTREVISTA - WILSON MOREIRA

No sábado, 30 de setembro de 2006, recebi em casa, às nove e meia da manhã, esses três craques, parceiros novos, e pela ordem de chegada, Simas, Rodrigo Ferrari e Pratinha, que me deram a honra da presença em meu mui humilde Buteco do Edu, não o virtual!

Pratinha, Simas e Rodrigo Ferrari, no Buteco do Edu

É que tínhamos marcada, às dez e meia da manhã, uma entrevista com Wilson Moreira, em sua casa, na aprazível vila na Rua Barão de Ubá, na Tijuca. O que não sabíamos é que Wilson Moreira e Ângela Nenzy transformariam aquela manhã/tarde num verdadeiro acontecimento! Muita cerveja, lombinho de porco, lingüiça, frango assado e uma sopa de ervilha monumental escoltaram o carinho dos anfitriões, que nos receberam de alma e coração abertos, estrada perfeita para que a conversa fluísse sem pressa, emocionada, cheia de momentos capazes de quase-derrubar a gente.

Foram 90 minutos de papo - que deixaram um inevitável gostinho de quero-mais - com o Wilson, que revelou-se, vocês verão, um baú vivo de histórias nunca dantes contadas. Estejam à vontade, que a semana é dele. E ao longo da semana, como tem sido praxe aqui no Buteco, agora sim o virtual, vou disponibilizando vídeos gravados ao vivo, com Wilson cantando acompanhando pelo 7 cordas do Pratinha.

Com vocês, Wilson Moreira!

Edu, Simas e Wilson Moreira

Eduardo Goldenberg: Wilson, você vai fazer agora em dezembro, 70 anos...

Wilson Moreira: É...

EG: Eu queria que você contasse pra gente o nome dos teus pais, o dia que você nasceu, e que contasse as histórias da tua infância, pra que a gente pudesse começar, as tuas primeiras memórias, eu sei que você tem uma história de herança, de teus avós, teus pais, de jongo, caxambu...

WM: Eu sou de 12 de dezembro de 1936. Você sabe que naquela época, rapaz... Eu era muito menininho, meu pai foi embora eu tava com 8 anos de idade... Meu pai foi embora em 45...

EG: Como chamava o seu pai?

WM: Meu pai era Francisco... Francisco Moreira Serra. Ele era conhecido como Chico lá em Realengo. Ele era funcionário do IAPI, o antigo Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários. Tinha vários institutos. Era IAPETC, IAPP, IAPM... Aí juntaram tudo e fizeram o INAMPS, não é isso? INPS, essas histórias todas... Mas você sabe que o velho, rapaz, era um desbravador. Quando terminou a guerra ele levou a gente lá pra ver os militares... Que ali é área militar, né? Realengo, Vila Militar, o Campo de Marte, o quartel da EVA, onde hoje é a Praça do Canhão.

Rodrigo Ferrari: Qual foi a rua que você nasceu?

WM: Eu nasci na Rua Mesquita, paralela à Vila Vintém. Morei em casa de sapê, no bom tempo... (ri) Tempo em que soltava balão e ninguém se incomodava com negócio de “vai queimar...”... Vai queimar nada! A gente fazia balão, soltava, fazia fogueira... Eu mesmo gostava de fazer balão. Fazia balão caixa, santos dumont, tangerina...

EG: E sua mãe chamava como?

WM: Mamãe era Hilda Balbina. Mineirona! Daquela área de Juiz de Fora, Matias Barbosa. Dali ela veio pra Paraíba do Sul, pra Andrade Costa, Avelar... Meus tios... tudo ali, primos, tava tudo ali. Até hoje eu tenho uma priminha que mora lá em Paraíba do Sul. Aliás, o Sérgio Cabral tá com um casarão lá em Paraíba do Sul... De vez em quando eu encontro com ele e a gente conversa, e eu até falo com ele isso... Minha prima mora lá, trabalha numa casa de material de construção... Ela já me falou que viu ele lá algumas vezes.

EG: Você tem lembrança do teu primeiro contato com música?

WM: Olha, rapaz... Meu primeiro contato com música? Eu sei dizer que o meu avô – minha mãe contava – , eu não conheci os meus avós, não... Minha mãe contava que eles eram sanfoneiros, jogavam caxambu, gostavam de dançar jongo... O jongo é uma coisa muito mística, uma coisa muito séria. É uma coisa religiosa. Esse jongo que eu faço é um jongo festivo, é um jongo que todo mundo pode cantar e brincar à vontade, sem abusar, né? Tem gente que quer me chamar de jongueiro! Eu não sou jongueiro! Jongueiros são os velhos, os meus antepassados foram jongueiros! Lá no Império teve grandes jongueiros! Seu Aniceto falava que o jongo era uma coisa muito séria, não era pra ser mostrado, assim, de qualquer maneira, em qualquer lugar. E é verdade! E você sabe que eu tinha um tio, meus primos lá de Paraíba do Sul e Avelar, que tocavam sanfona de oito baixos e a origem deve estar vindo daí, né? Eu tive influência dessas coisas todas. Que quando eu era moleque novo eu ouvia muito rádio, Rádio Tupi, Rádio Mayrink Veiga, Rádio Mauá, tinha muito programa de rádio. Heber de Bôscoli, Iara Sales, Lamartine Babo... Houve um tempo em que eu até cheguei a ir, rapaz, no início da minha carreira, à Rádio Mayrink Veiga assistir a um musical e ali eu vi o Heber de Bôscoli, a Iara Sales, o Lamartine Babo...

RF: Anos 50 isso?

WM: Foi, nos anos 50.

EG: Quando é que você diria que começou a sua carreira?

WM: Sabe... Eu tinha 14 pra 15 anos... 16, por aí.

RF: Qual a primeira música que você fez?

WM: A primeira mesmo? (pensando)

RF: Quem foi teu primeiro parceiro? Ou a primeira mesmo você fez sozinho?

WM: Eu fiz sozinho. Fiz sozinho. Agora, o meu primeiro parceiro mesmo foi um camarada que tinha lá em Padre Miguel, chamado Ivan Pereira, que tinha o apelido de Da Volta. É um cara que comigo começou tudo. Eu e ele, naquela luta na Mocidade Independente... Depois eu vou contar como é que eu fui pra Mocidade Independente. Aí ele conversou comigo e sugeriu: “Ô, Wilson, vamos fazer um samba juntos?”. “Vamos!”. “É que você já me mostrou um negócio aí e eu tenho um negócio que eu gostaria de te mostrar, eu sei que você gosta de cantar...”. E eu gostava mesmo! Minha irmã foi cantora, foi caloura, né?

EG: Como se chamava a sua irmã?

WM: Julieta. Minha irmã era funcionária da Fábrica Bangu naquela boa época?

Simas: Eram quantos irmãos?

WM: Seis! Perdi uma irmã novinha... Isso eu morava num casarão lá em Realengo. Realengo foi o meu reduto. Onde eu nasci... E eu morei em vários lugares ali, sabe? Aí uma irmã foi embora cedo. A Julieta foi embora mais tarde. Julieta era mais velha do que eu. Ela gostava de cantar... Antigamente tinha programa de calouro em qualquer lugar. O pessoal fazia programa de calouros, sabe? O pessoal botava a gurizada que tinha talento pra cantar e dava um prêmio! E minha irmã cantava muito... Tinha umas músicas que a Ângela Maria cantava... Linda Batista... Emilinha Borba... (Wilson pigarreia uma, duas, três vezes...) Pô... se eu bebesse conhaque não aconteceria isso!!!!!

(risos gerais)

WM: Que coisa, né? Vou pedir a Ângela pra botar um vinho pra mim...

(pede o vinho)

WM: Olha, vou te contar uma coisa! Se a minha irmã gostasse de carreira de cantora ela talvez fosse até aproveitada como cantora! Porque ela cantava direitinho, sempre tirava o primeiro lugar nos programas de calouro que tinha lá em Realengo, Padre Miguel... Naquela época nem era Padre Miguel, era Moça Bonita, né?

RF: E esses programas de calouro eram festas na rua ou eram programas de rádio mesmo?

WM: Eram festas nas casas das pessoas. O pessoal fazia uma brincadeira em casa e fazia aquela programação de calouro e as meninas se inscreviam, a rapaziada que gostava de cantar...

RF: Era uma coisa do bairro?

WM: É verdade. Você sabe que tinha até uma casa, lá em Realengo, que era uma espécie de teatro... Tinha umas peças teatrais... Tu vê que a rapaziada ali era bem aproveitada nisso, sabe?

RF: Tinha nome essa casa, esse teatro?

WM: Não! Era uma casa de família!

RF: Que a família transformava num teatro?

WM: É... Nos anos 50...

(Ângela chega com vinho do Porto)

WM: Não... (rindo) Isso é pra tomar só um pouquinho... Pega aquele que tá lá embaixo da pia...

Tiago Prata: Os cantores que concorriam nesses programas tinham o acompanhamento de um regional?

WM: Não! Tinha um cara que tocava cavaquinho e violão. Só. Os coroas ali do bairro... Qualquer um! (rindo) Era o maior barato! Você sabe que ali em Realengo teve grandes músicos como Darly Louzada... Grande 7 cordas! Um dos primeiros 7 cordas!

TP: Tocava no regional da Rádio... não lembro agora o nome...

WM: Nacional Tupi!

TP: É!

WM: Ele começou no Ary Barroso. O Ary Barroso bateu nas costas dele e disse “vai à luta que você é bom, rapaz!”. Foi meu parceiro ele... Eu devo ter fita guardada em algum lugar...

TP: Tem música tua gravada com ele?

WM: Com o Darly?

TP: É.

WM: Tem! O Darly participou do meu primeiro disco, chamado Matéria Paga. Não era independente, era matéria paga naquela época! (todo mundo ri) Isso em 67. O Darly organizou! Você sabe quem tocou na época comigo? Darly, Periquito, aquele Periquito, antigo, do cavaquinho, o Arlindo Russo do Regional da Tupi.

TP: Mas o Darly Louzada compôs contigo?

WM: Tenho duas músicas com ele.

(chega o vinho que o Wilson pediu)

Wilson Moreira

TP: Meu pai chegou a pesquisar um pouco sobre o Darly, um cara muito esquecido...

WM: Ele era ótimo!

EG: Mas vamos volta um bocadinho, Wilson! Você tava contando sobre tua parceria com o Da Volta...

WM: É... Com o Da Volta eu fiz samba de terreiro, na Mocidade. Fiz samba-enredo, meu primeiro samba-enredo, primeiro e segundo samba-enredo eu fiz com ele!

RF: Pra Mocidade?

WM: É, pra Mocidade...

S: Wilson, você foi fundador da Mocidade?

WM: Eu fui um dos fundadores, me considero um dos fundadores, porque tinha uma escola de samba em Realengo, nos anos 50, chamada Unidos da Água Branca. Onde começou tudo.Eu tocava tamborim e ficava ali, né?, assistindo os ensaios e tocando tamborim. Aí... Veja só... Um dia, já próximo ao carnaval, chegou lá um diretor da Mocidade Independente... A Mocidade era uma escola que desfilava no bairro, em Padre Miguel, Bangu e Realengo. Aí eles se inscreveram na associação das escolas de samba e foram desfilar na Praça Onze no carnaval. Daí chega um diretor um dia, nós estávamos numa brincadeira, fazendo um ensaio. Terminou o ensaio a gente ficou ali batendo papo, né? E eu sempre participando do papo junto com a rapaziada. Aí chegou um diretor da Mocidade, um relações públicas, assim: “Boa noite! Boa noite, gente! A Unidos da Água Branca vai desfilar no carnaval? Aonde?”. “A gente desfila em Realengo mesmo..., no ponto central do bairro, né?, no desfile principal.”. Aí ele falou: “Não interessa a vocês desfilar com a gente no carnaval lá na Praça Onze?”. “Vamos ver, né?”... O presidente nosso, era o Tião... A gente chamava ele de Tião Presidente porque ele andava com um bracelete, uma faixa aqui no braço escrito “PRESIDENTE” (ri muito) O Tião era uma figura! Andava pra lá e pra cá com aquilo... “PRESIDENTE”. Aí o presidente conversou com o Renato – Renato era irmão do Mestre André, né? Ele era relações públicas da Mocidade – e o Renato disse “Olha, a Mocidade vai desfilar pela primeira vez na Praça Onze. Então a gente tá querendo conteúdo, tá querendo gente, e como vocês são verde e branco igual a nós...”.

RF: Que ano foi isso?

WM: Foi em 52, 53... 54, mais ou menos por aí. Então ele continuou: “Como vocês são verde e branco, a gente tá pegando essa turma desses blocos, dessas escolas que são verde e branco pra juntar com a gente e ir lá pra Praça Onze, pra fazer um número suficiente pra gente poder alcançar uma boa posição lá.”. Aí o nosso presidente topou: “Gente, vocês querem desfilar com a Mocidade Independente no carnaval?”. Aí fomos desfilar com a Mocidade. A Mocidade tirou em quinto lugar na Praça Onze. Eu me considero fundador, né? Tiramos em quinto lugar e sabe que nessa brincadeira a Unidos da Água Branca acabou? Ficou todo mundo lá na Mocidade...

RF: Fundiu tudo?

WM: É. Fundiu. Não foi uma fusão oficial, não! O pessoal foi pra lá! Que nem o Salgueiro... O Acadêmicos do Salgueiro é uma escola nova! Tinha a Unidos do Salgueiro que não fundiu com o Salgueiro! Não juntou! Parece que também acabou e foram pra lá! Eu me lembro disso... A Acadêmicos de Salgueiro é uma escola nova! Isso nos anos 50...

S: Salgueiro é de 1954...

WM: É... Salgueiro não é uma escola velha, não. É uma escola nova. Como o Império também não é uma escola antiga. A Portela tem o quê? Oitenta e tal! A Mangueira também tem uma cacetada de anos, né?

RF: Esses sambas-enredo que você falou que foram os primeiros que você fez...

WM: Foi em 62!

EG: Você e Da Volta?

WM: Eu e Da Volta.

RF: O primeiro que emplacou ou o primeiro que você fez? Ou já emplacou logo o primeiro?

WM: Vou te contar. Sabe o que aconteceu? Nós recebemos o histórico, o tema – antigamente era histórico mesmo, hoje em dia é sinopse, né?! (todo mundo ri) – e o pessoal vinha animado, quando ia andando lá pra Mocidade dizendo “Vai lá na Mocidade?”, “Já apanhei o meu tema, hein!”, “Tá legal! Vou pegar o meu agora!”. O pessoal ia animado pra ver aquilo, pra ler... Era a História do Brasil! Era tema obrigatório! Hoje em dia é grego, Europa...

RF: Chico Recarey!

WM: (rindo muito) Chico Recarey! Mas era História do Brasil. Era obrigatório! E sabe que o Brasil é tão grande... Tem coisa aí à beça pra exaltar, sabe que ainda tem? Os caras não querem. Acham que não dá leite mais. Dá leite, sim, sabe? Tem tanta coisa aí pra você exaltar aqui dentro do Brasil, coisas bonitas..., mas eles partem lá pra fora... A Portela esse ano vem com negócio do Olimpo, né? Eu não faço mais samba-enredo. O samba-enredo tomou um rumo muito diferente. Aliás as escolas tomaram um rumo... Viraram Hollywood, né? A Mocidade virou Hollywood!

RF: Não é mais um espetáculo pra quem faz a festa, mas pra quem tá a fim de comprar...

WM: É... Tu vê os sambas-enredo que eu ganhei junto com o Nei Lopes, aquela linha, né? Eu fiz um samba com o Adalto Magalha... Nós concorremos na Unidos da Tijuca... Eu não podia aparecer que a Unidos da Tijuca era do primeiro grupo, como a Portela, e eu pertencia à ala de compositores da Portela e o Adauto à ala da Unidos da Tijuca. Eu falei: “Adalto, eu vou fazer um samba contigo, mas você canta sozinho, lá, que eu não posso nem der as caras lá, se não o Seu Natal vai me dar umas lambadas, lá!” (todo mundo ri). “Pô, mas o que é que é isso?”. “Não, pô... Bota um parceiro...”. O Adalto morava do lado de um diretor. “Bota o nome daquele diretor lá no samba junto contigo!”. “Não, não vou botar ele não! Quero botar é contigo.”. Aí o samba ficou em segundo lugar... Aquele samba que o Marçal gravou: (cantando) “Nessa epopéia de glória / A cultura de um povo!”... Uma história sobre os malês, que é uma história bonita, sobre os negros malês, são uns negros bacanas, né?... Uma história muito bonita... Aí uma vez eu fui com o Adalto lá no morro, depois do carnaval, né?, no tempo em que se podia ir no morro à vontade, lá no Borel, aí um componente da escola e o compositor que ganhou, Jorge Moreira, falaram assim: “Esse samba aí que você fez era pra ser o vencedor... um samba lindo!”, e eu “Pois é, rapaz, mas infelizmente ficou em segundo lugar...”. Aí, veja só, o Marçal tava na Portela, né? Marçal brigou lá com a diretoria da Portela e foi pra Unidos da Tijuca. O presidente da Unidos da Tijuca contratou o Marçal: “Marçal, tu quer vir pra cá dirigir a nossa bateria?”. “Vou...”. Aí um dia o Marçal tava consertando os instrumentos lá, e tal, e disse que os sambistas lá do Borel começavam a cantar: “Nessa epopéia de glória / A cultura de um povo / Mostramos com graça / A força de uma raça...”... E ele: “Puxa vida... que samba bonito é esse?”, “É um samba que perdeu aqui na Unidos da Tijuca...”, “Pô, de quem é?”, “Adalto Magalha e Wilson Moreira!!!!!”.

RF: Que ano foi isso, Wilson?

WM: Isso foi em...

S: Isso deve ter sido no início dos anos 80. Foi o enredo “Salamaleikum: a epopéia dos insubmissos malês”.

WM: Isso! Isso mesmo! Isso mesmo! Pô... esse aí, hein! Que memória!

EG: É o nosso historiador!

(Wilson ri muito)

RF: Volta lá pra 62 quando você pegou o tema...

WM: Pois é. Aí eu peguei o tema e o Da Volta falou assim: “Wilson, como é que a gente vai fazer? Tu vai pra minha casa, eu vou pra tua...”. E eu: “vai ser isso. Eu vou pra tua casa, tu vai pra minha, a gente marca um dia na tua casa, outro dia na minha casa...”. Aí começamos. Lemos e relemos o tema, né? Tava bonito! Aí eu comecei a cabeça: (cantando) “Brasil / Oh, meu grande Brasil / Hoje exaltamos mais um trecho da tua História / Glórias e glórias / Grandes vultos em nossa memória! / Brasil no campo cultural / Apresentamos com grandeza / Abrilhantando este carnaval / Laiá laraiá laraiá lalaialaiá...”. Era o solfejo. Aí entra a outra parte... Mas a terceira parte eu não lembro... Porque houve um problema lá na hora da reunião que nós fizemos – a reunião era na casa do Seu Eurico, era o presidente da ala dos compositores – e todo mundo com o samba pronto foi pra casa dele. Ele disse: “Olha, vamos na minha casa que hoje vai sair o samba de enredo escolhido para o desfile de carnaval da Mocidade”. Seu Eurico resolveu fazer o seguinte... Quando chega nessa parte (canta) “De Dom Pedro Segundo / Herdeiro do trono do Imperador / Dom Pedro Primeiro”, ele disse: “Bota essa outra parte aqui do Jurandir!”. Jurandir é um cara que foi meu parceiro e que já foi embora. “Bota essa parte do Jurandir aqui e bota essa outra parte do Arsênio!”. E eu não lembro das duas partes, rapaz... Ficou bonito... Aí terminava com o solfejo. E nós fomos desfilar na avenida e a escola ficou em sexto lugar. Que era uma colocação boa pra Mocidade... Que naquela época tinha as chamadas quatro grandes, Império, Portela, Salgueiro e Mangueira. Mas tinha Capela, Aprendizes de Lucas, né? Que eram boas pra caramba! E a Mocidade entrou ali com a bateria, era chamada a escola da bateria! Não sei se vocês souberam disso. Ela tinha uma bateria fenomenal!

S: A paradinha...

WM: Mestre André... E essa paradinha, rapaz, foi dos anos 50. Um barato. Foi um barato. Então a Mocidade já desfilou entre as grandes, na Rio Branco. Foi um barato. Tomei o gostinho da coisa e no outro ano nós apanhamos o outro tema. Esse primeiro foi “Brasil no campo cultural”. Um título bonito, um enredo bonito, um histórico bonito, fácil, bom de você ler. Hoje em dia você vai fazer um samba, todo mundo se mete, carnavalesco se mete, o compositor não tem direito de fazer as coisas à vontade.

TP: O patrocinador se mete...

WM: É... Você sabe que bom é você pegar um tema, digamos... Você vai fazer um enredo sobre o Estephanio´s. “Wilson, o tema taí, leva lá o tema...”. Aí tu me deixa à vontade e eu vou fazer o samba, e o bloco sai (imita o som de uma bateria). Né? Vou fazer o samba como nós fizemos o “Sandália Amarela”... “Sandália Amarela” foi um samba de bloco, de desfile de bloco, sabia disso?

RF: Ah é? Qual bloco?

WM: Foi... (rindo) O lance foi o seguinte... Não sei se isso deve entrar aí...

(grita geral)

WM: (rindo muito) Não é nada demais, não... É que eu tava contando uma história, vem outra...

RF: Esses parênteses são bons!

WM: Foi nos 80. Ali na Avenida Passos com Senhor dos Passos, tinha uma sobrado, como tem até hoje...

RF: Agora tem um McDonald´s embaixo?

WM: Tem, agora?

RF: Não sei se é esse ou se é o do lado... Em frente à igreja?

WM: Não... Bom... Veja só... Ali era o Nei Lopes, Rubem Confete, Zé Luiz, Ari Araújo, Flávio Moreira, Os Vissungos... Lembra desse grupo, Os Vissungos? Era um grupo de samba, de samba-afro... Sabe o que aconteceu? Ali rolava show... era tipo Zicartola... roda de samba... tipo Encontros Cariocas, sabe? Então no carnaval o pessoal resolveu fazer um bloco: “Olha, vamos fazer um bloco e escolher um samba...”. Era o Bloco dos Apóstolos do Samba. Aí, escolhe samba daqui, escolhe samba dali, a gente cantava muito esse samba lá (cantando): “Eu dei a ela / Um par de sandálias / Da cor do meu chapéu de palha / Ela de saia amarela / E uma blusa de filó / E eu com uma flor na lapela do meu paletó / Eu dei a ela / Um par de sandálias / Da cor do meu chapéu de palha”. Aí tinham uns versos nossos e tinha os versos da malandragem que cantava de improviso. Tudo dentro dessa música, o pessoal botava os versos de improviso. Então a direção do bloco disse: “Tá escolhido o samba pro desfile do carnaval dos Apóstolos, pronto! É esse aí! Samba de Wilson Moreira e Nei Lopes, Sandália Amarela”. Eu disse, “Pô, mas tem a ver?”, “Tem a ver!”. Aí eu “Bloco é um negócio mais quente...”. Tinha o Cacique de Ramos, tinha o Bafo da Onça, mas ele disse “Não, mas é esse samba que vai pra avenida!”. E você sabe que deu pé?

EG: Esse bloco desfilou quantos carnavais?

WM: Desfilou um carnaval!!!!!

(todo mundo ri)

pôster na parede da sala, na casa de Wilson Moreira

EG: Então deixou de ser samba pra ser o hino, então!

WM: (rindo) É... pergunta isso ao Nei Lopes uma hora... Abrimos o desfile... o Nei Lopes acho que vai explicar isso melhor... A RIOTUR nos cedeu o carro de som, oito horas da noite, desfilando pela avenida... Em cima tinha os velhos partideiros dizendo de improviso e cá embaixo a gente cantando: (cantando) “Eu dei a ela / Um par de sandálias / Da cor do meu chapéu de palha / Ela de saia amarela / E uma blusa de filó / E eu com um flor na lapela do meu paletó / Eu dei a ela”. Todo mundo aprendeu na hora e cantava junto! Aí os caras diziam uns versos (cantarola)... Nós saímos lá do Simpatia, lembra do Simpatia, aquela choperia? Acabou aquilo, né? Era ótimo. Do início da Rio Branco até a Praça Floriano. Aí o dono de um bar, de um restaurante, ali na Santa Luzia falou assim: “Vocês tão todos convidados a tomar um chope lá no meu restaurante... Eu gostei do samba... E ele cantou ´Eu dei a ela / Um par de sandália!´”... Foi um barato isso! Aí quando foi em 80 nós fizemos o Arte Negra, né? E em 85 nós fizemos o Partido Muito Alto. O falecido Rogério Rossini e o Genaro, que foi o nosso produtor, disseram: “Bota o ´Sandália Amarela´...”. Aí o Rogério fez aquele arranjo bonito... (cantarola)... Bonito, né?

S: Maravilha!

WM: E a música taí até hoje, rapaz... E é pedida... Se eu não cantar, o pessoal cobra! (rindo) Deu um tremendo pé!

EG: Wilson, vamos retomar o fio da história das parcerias... Quando você começou, lá atrás, com o Da Volta, você já tinha consciência de que queria viver de música?

WM: Tinha!

RF: Você tinha outro emprego?

WM: Eu tinha. Eu vou dizer um negócio a vocês... Eu fui, rapaz... Eu vou dizer o que eu fui... Antes de eu ser bombeiro hidráulico eu fui uma porção de coisas... Entregador de marmita, guia de cego, vendi doce, bala, eu vendia amendoim na ponte de Realengo... Eu era conhecido como Amendoim até um determinado tempo lá em Realengo. O pessoal dizia: “Esse aí é o Amendoim mesmo?” (ri muito) (todo mundo ri) Pessoal me conhecia como Amendoim, não me conheciam como Wilson Moreira.

RF: Nessa hora então você já sabia que era compositor?

WM: Exatamente! Mas aí, rapaz, veja só... Com o Da Volta eu fiz vários sambas de terreiro... Eu tinha samba de terreiro que até hoje é cantado por aí... O pessoal lá de cima, quando me encontra diz “Ô, Wilson... (cantando) ´Já pedi pra você me deixar...´” isso era samba de terreiro lá na Mocidade!

EG: Você lembra de um? Faz aí pra gente gravar!

WM: Agora? Olha só... Vou fazer um inédito que é daquela época e que tá no projeto da Ângela que se Deus quiser a gente vai transformar em disco: (cantando) “Amei demais alguém, porém / Não deveria amar / Sofri com o pão / Que o diabo amassou com os pés / Hoje...”.

EG: Esse é você com quem?

WM: Eu e Da Volta.

RF: Nessa época era samba de terreiro sempre, né?

WM: Era... Samba de terreiro prevalecia, rapaz, na quadra! Incrível, né? E a Mocidade era uma escola tão simpática, que as pessoas saíam da cidade, eram jornalistas, pessoal de rádio... Jamelão não saía da Mocidade! Seu Natal da Portela era freqüentador assíduo lá, tinha até um cargo na Mocidade. Então ele ia pra lá assistir aos ensaios e ficava amarrado no samba de terreiro que a gente fazia lá. Aí um dia ele chegou e me convidou. Quando eu acabei de cantar o samba e desci do palanque e falou assim: “Você não quer ir pra Portela não, garoto?” Aí eu falei assim: “Olha, Seu Natal, eu adoro a Portela, gosto da Portela desde essa idade de pequeno, agora... um dia eu vou pra lá... Que eu sou daqui, né?!”. Eu tinha um samba que eu botei no Okolofe, produção do Maurício: (cantando) “Até breve / Amável povo da cidade / Que tanto me orgulha / Venho de lá das quebradas, de longe / Honro o nome de uma Mocidade / Digo com prazer / Com prazer / Mocidade Independente é uma das razões do meu viver / Canto com muito alegria / Esqueço a nostalgia / Que tanto me invade / Até amanhã, povo da cidade / Ou até para o ano / Saudades vou levando / Até / Vou partir / Brevemente nos veremos / Sou da Mocidade”.

TP: Esse samba é seu sozinho?

WM: Meu sozinho. Sabe o que aconteceu com essa samba? A diretoria da escola falou assim: “Esse samba vai ser o samba de fechamento do desfile no carnaval.”. Nesse ano a Mocidade estava desfilando da Candelária pra Central do Brasil. Não lembro qual era o samba-enredo desse ano, mas foi um dos últimos anos meus na Mocidade. Eu já estava saindo fora. Quando tava chegando quase perto da Central a bateria parou, o diretor de harmonia mandou parar a bateria e entrar nesse samba: (cantando) “Até breve / Amável povo da cidade / Que tanto me orgulha / Venho de lá das quebradas, de longe / Honro o nome de uma Mocidade / Digo com prazer / Com prazer / Mocidade Independente é uma das razões do meu viver / Canto com muito alegria / Esqueço a nostalgia / Que tanto me invade / Até amanhã, povo da cidade / Ou até para o ano / Saudades vou levando / Até / Vou partir / Brevemente nos veremos / Sou da Mocidade”. Aí todo mundo fazia assim ó (acena com o braço)... Era bonito pra chuchu, rapaz!!!!! Essa história é contada até hoje, o Confete fala isso, o Zé Luiz do Império... O Zé Luiz não saía da Mocidade! Esse pessoal ia todo lá pra cima, sabe? Era uma escola simpática e tinha um ensaio bonito. Além disso, quando terminava o ensaio, as baianas iam pra cozinha fazer um panelão – um nunca vi um caldeirão igual aquele, rapaz! -, um caldeirão grandão, acho que era sob medido (ri muito) cheio de sopa, rapaz! Aquela sopa rolava até uma hora da tarde, duas, três, o pessoal não ia pra casa, continuava ali. Aí à noite começava o ensaio, domingo, né? O pessoal já tava ali, continuava... E os caras que vinham da cidade (rindo) não voltavam...

EG: Quando e por que você saiu da Mocidade?

WM: Eu saí da Mocidade em 68. Houve uma animosidade comigo lá, houve um problema lá comigo... Eu não gostei do tratamento que me deram lá... O presidente da ala das compositores não me tratou muito bem, eu discordei e me afastei da ala. Me afastei, fiz uma carta pelo próprio punho e mandei pra lá. Foi me afastamento. Mas a diretoria ficou “Poxa, Wilson, você vai sair da escola?”. “Não, vou me afastar!”. Eu tinha uma ala, uma ala de conjunto, e disse “Vou passar a sair na minha ala de novo, porque na ala de compositores o presidente não tá querendo que eu fique, então vou me afastar”. Aí sabe o que aconteceu? Eu tinha um amigo, que era relações públicas da Portela, e esse amigo morava em Padre Miguel. Encontrei com ele na cidade, a gente ia apanhar o trem pra ir pro subúrbio e ele falou assim: “Wilson, não vou subir agora não , eu vou saltar em Madureira que eu tenho que ir à reunião na Portela.” E eu disse “Pô, rapaz, eu vou aproveitar e acho que eu vou contigo na Portela também...”.

EG: O Seu Natal já tinha te convidado pra ir, né?

WM: Já tinha me convidado! Aí eu fui com ele à reunião.

EG: 68, né?

WM: Isso foi em 68... 68... Quando eu cheguei na Portela a diretoria tava formada pra reunião. Aí ele falou assim “Olha aí! Vim com o Wilson Moreira, que o Wilson Moreira quer assistir nossa reunião...”. Seu Natal tava sentado assim, do lado, ele era Presidente de Honra, o presidente da escola, oficial, era o Seu Armando Passos. Aí a diretoria toda levantou pra me cumprimentar: “Olha, muito obrigado pela presença, esteja à vontade!”, e o Seu Natal falou assim “Esse é o garoto que eu falei que convidei pra vir aqui pra Portela...”. Pô, aquilo foi o maior aval! Eu disse: “Seu Natal, muito obrigado... Prazer...”. Ele disse “Você quer assistir à reunião dos compositores? É lá em cima!”. Tinha uma escadinha... na Portelinha, né?. Aí eu fui lá. O presidente da ala na época era o Picolino, o Carlos Imperial era diretor não sei de quê... A diretoria era bem formadinha, direitinho, sabe? Tava Casquinha, Monarco, Valter Rosa, só tinha fera, Jair do Cavaquinho, Chatim, a turma toda. Aí me abraçaram, falaram “Pô, Wilson, esteja à vontade. Veio assistir nossa reunião?”, “Vim assistir e vou ficar!”... Depois daquela recepção!!!!! (ri muito) A diretoria toda de pé, rapaz! Fiquei na Portela! Até hoje! A Portela ainda não tinha o Portelão, a Portela ensaiava no Imperial, que era um clube que tinha em Madureira, ensaiava no Madureira Atlético Clube e ensaiava no Mourisco. Aí fui ficando. Um dia marcaram comigo lá, perguntaram se eu queria mostrar algum samba, se eu tinha algum samba... E veja só! Tinha uma reunião, que nem nós estamos aqui, engraçado... igualzinho, rapaz!!!!! (fica com os olhos marejados) Cada um cantava um samba. Casquinha cantava samba de terreiro...

Wilson Moreira

EG: Isso aonde, Wilson?

WM: Isso na Portelinha. Isso em 69, mais ou menos por aí... Casquinha, Valter Rosa, Chatim, todo mundo cantando. “Wilson, tem algum samba que tu fez pra Portela?”. “Tem”. Aí cantei meu samba: (cantando) “Quando eu brigar com alguém / Ou tiver um transtorno qualquer / Faça da vida um prazer / Que o mais belo requinte é viver / Deixa a tristeza pra lá / E vamos cantar / Pra comemorar com alegria / Vem pra Portela sambar / No calor autêntico...”. Uma coisa assim: (cantando) “Portela é paz / Portela é gente / Portela é carnaval!”. Aí eu cantei. Mandei fazer naquela época uns folhetos, né? Fiz uns folhetos, pra distribuir pro pessoal, cantei nos ensaios, foi uma maravilha, o samba cresceu na quadra...

EG: Como chama o samba?

WM: “O Mais Belo Requinte”. Aí a Portela ia fazer um disco em 70. Escolheram esse samba. Botaram esse samba no disco. Pô, eu novo na escola, na ala dos compositores... Pô, que bom... Tava iniciando minha carreira...

EG: Mas também você entrou com a benção do Seu Natal, né?

WM: Pois é! (rindo) Não é? Foi um barato! Fiquei como parceiro de outros compositores... Na Portela eu fui parceiro do Antônio Alves, foi um cara que foi vencedor de samba-enredo, fui parceiro de Monarco, fui parceiro do Jair do Cavaquinho, Candeia... Candeia foi o meu parceiro mais constante na Portela.

EG: Então conta aí pra gente a história dessa tua parceria com o Candeia... Como você o conheceu...

WM: Eu já conhecia o Candeia antes dele estar na cadeira de rodas, mas eu não tinha intimidade com ele. Eu ia na Portelinha assistir ensaios e o Candeia ficava lá ajeitando os troféus... Aquele negro alto, né?... (de olhos marejados novamente)... Bom compositor... Era parceiro do Valdir 59 e outros... Ele soube que eu estava na Portela já na cadeira de rodas. Quem tocava e fazia show com ele era o Osmar do Cavaquinho e o Jorge da Conceição. Jorge da Conceição morou em Realengo também. Era vizinho do Darly Louzada, lá na boa época. Ali tinha onde o Jorge morou tinha o Darly, tinha o Neco, do violão, Adilson Bolinha de Sabão, que era irmão do Neco, era bossanovista... (cantando) “Sentado na calçada de canudo e canequinha...”... Era uma coisa assim, né? Irmão do Neco! É crente hoje em dia... Acabou...

(todo mundo ri muito)

WM: Virou crente... crente é fogo! Meu amigo, mas puxa vida... O Candeia falava pro Jorge: “Ô, Jorge, eu tô sabendo que o Wilson Moreira que era da Mocidade tá na Portela com a gente, né? Traz ele aqui em casa pra gente conversar um pouco...”. Aí o Jorge foi lá em casa, em Realengo, ele morava no Batam, na época em que no Batam podia se andar tranqüilamente, hoje em dia tá meio brabo lá. “Wilson, o Candeia tá querendo que tu vá na casa dele, ele tá querendo conversar contigo, lá. Ele mora em Jacarepaguá. Vamos lá? Eu toco com ele, tô sempre lá...”. Aí fomos na casa do Candeia. Chegou na casa do Candeia e o Candeia: “Pô, Wilson Moreira, como é que é, rapaz? Tô sabendo que tu tá na Portela...”. “Tô”. “A gente precisa fazer uns negócios juntos, né?”. “Vamos...”. Aí Candeia de cara me deu logo uma música pra terminar pra ele, “Quero Estar Só”: (cantando) “Quero estar só / Não me veja no espelho pra não me ver acompanhado...”. Aí eu falei: “Candeia, eu tô com um samba na Portela, pra cantar nos ensaios...” – isso depois do “O Mais Belo Requinte” – “E eu vou até passar logo pra você botar uns versos aí pra gente empurrar esse samba nos ensaios...”. Era o “Não Tem Veneno”: (cantando) “Provar / Que não tem veneno / Que não tem veneno, não / Pode provar”. Aí ele botou uns versos... (cantando) “Saí pra trabalhar de manhã / Já caiu o sereno / E voltei de noite... / Diga à dona da casa pra não fazer prato pequeno...”. Tinha um cara que gostava tanto desse samba que um dia eu cheguei lá Portela, e eu não tinha letra pra mandar pro pessoal cantar, e ele disse: “Pô, rapaz! Que samba que vocês fizeram, você e Candeia! Vai lá em cima que eu botei um negócio no palanque!”. (ri muito) O cara botou um pacote assim, cheio de letras!!!!! Montão assim, ó! Aí eu jogava pro público, foi o maior sucesso na quadra! E a bateria tocando... Puxa vida... (olhos marejados de novo) Aí a Sabrina, uma passista da Imperatriz, passista do Teatro Opinião... esse negócio de mulata... mulatas, cabrochas... (ri)... Ela sambava no Teatro Opinião... Às segundas-feiras tinha aquela roda de samba, era um show internacional, né? Era um show pra pandeirista, um jogava o pandeiro na mão do outro, Rogério, Pimpolho, a turma toda... Carlinhos do Pandeiro... E aquelas mulheres dizendo no pé... (gargalhando) Rebolados... Aí a Sabrina foi na casa do Candeia: “Candeia eu vou fazer um disco... queria música...”. E ele: “Aproveita ouve essa música minha e do Wilson Moreira... (cantando) ´Provar / Que não tem veneno / Que não tem veneno, não / Pode provar...´”... Aí ela gravou, rapaz! Gravou, tocou na rádio! Naquela época era fácil gravar e fácil de tocar nas rádios. Ela tocava, rapaz, o tempo todo... E foi o maior sucesso, modéstia à parte... Depois nós viemos gravando, e o povo canta junto até hoje... Eu hoje em dia brinco com o pessoal... Canto, aponto assim (aponta pra um prato de sopa)... (cantando) “Que não tem veneno, não / Pode provar!”. O pessoal gosta, curte isso à beça... (rindo muito)

EG: Quantos sambas você fez com o Candeia?

WM: Ah, rapaz... Você sabe que tem sambas inéditos? Tem o “Afirmação”... Eu há pouco tempo fui fazer um show em São Paulo, convidado do Elton Altman, eu Paulinho, Tereza Cristina, Quinteto em Branco e Preto, Luiz Carlos da Vila, e eu cantei um samba inédito chamado “Samba Livre”: (cantando) “O samba é livre / O samba é vida, oh minha gente / Vem para o samba / Que eu vou também / Samba, menina / Samba, moço / O samba é quente / O samba é bom / Mexe com a gente / Sinto a cadência do samba no meu coração / Tenho como objetivo na minha paixão / Ser livre é sambar / É gente, é vida / Vem comigo cantar...”. Você sabe que esse samba, na primeira vez que eu cantei lá todo mundo cantou junto? O SESC Pompéia tava cheio, maior barato... O Elton ficou doido... E agora taí, né? Nos meus 70 anos eles querem fazer um trabalho de disco comigo, de show, lá no SESC Pompéia, agora em dezembro... esse samba tá! Eu tenho parcerias com Mano Décio da Viola, Zé Kéti, Nelson Cavaquinho, Carlos Cachaça...

S: Tudo inédito, é?

WM: Tudo inédito... Maurício Tapajós... tudo inédito... O Pedrinho Altman tá pra vir aqui... Eu vou ver se eu não me esqueço de levar o Pedrinho Altman lá no Estephanio´s... Depois tu deixa o endereço comigo! O Pedrinho Altman é filho do Elton, né? Eles são botequineiros lá... Gostam pra caramba de farra...

S: Wilson, e você acompanhou o Candeia quando o Candeia rompeu com a Portela e fundou a Quilombo, né?

WM: É. O Candeia não ficava satisfeito com a mudança, com o rumo que as escolas de samba vinham tomando... Essa Hollywood toda que tá hoje em dia, o Candeia não gostava... O Candeia era um cara muito autêntico, muito tradicional, sabe? Ele falou: “Wilson, eu vou fundar uma escola de samba. Você tá comigo?”. Eu falei: “Candeia, eu só não vou sair da Portela...”. “Não, não precisa sair da Portela, ninguém precisa sair de suas escolas. Como o Xangô tá com a gente, Elton tá com a gente, Clementina tá com a gente, fulano, beltrano, sicrano..., Jorginho Peçanha tá com a gente”. Jorginho do Império, né? Eu falei “Tá legal!”. “Vamos fundar a Quilombo.” Eu tava na época lá, fui até diretor de harmonia junto com o Jorginho Peçanha... Eu tenho a minha carteira de fundador guardada até hoje, aí, diretor de harmonia da Quilombo. O Nei Lopes era salgueirense e era também diretor da Quilombo. Eu não participei do primeiro desfile da Quilombo, eu tava com compromisso na Portela. Isso foi em 75... A fundação... Mas em 78 eu participei até de samba-enredo. Eu tava na casa do Candeia, a Tereza Raquel, filha do Solano Trindade lá de São Paulo, aquele grande poeta, ator... Ela chegou na casa do Candeia e a mãe dela morava, ou mora, em Jacarepaguá... Ela falou: “Estou com um tema aqui bom pra Quilombo, vou te mostrar... ´Ao Povo em Forma de Arte´”. Bonito tema! Aí o Candeia leu, releu, levou pra diretoria e todo mundo ouviu, viu e foi escolhido o tema de enredo pra Quilombo. Aí o Candeia me mostrou e eu disse: “Candeia, eu vou deixar o Jorginho na direção de harmonia e vou fazer esse samba com o Nei Lopes, tá bom?”.

S: Você conhecia bem o Nei?

WM: O lance foi o seguinte. Eu não conhecia o Nei muito bem. Em 74, quando eu fui produzido pelo Adelzon Alves, lá na ODEON, quando eu gravei “Mel e Mamão com Açúcar” e “O Meu Apelo”, naquele disco “Quem Samba Fica”, que era um projeto que o Adelzon tinha que lançou em 72 o João Nogueira, o Roberto Ribeiro, né? Era tipo um pau de sebo, que eles botavam cinco pessoas no disco. E ele falou pra mim que ele ia fazer outro em 74 e que eu estava, com aquelas duas músicas, que eu cantava na roda de samba que ele fazia na rádio à noite... Rádio Globo todo mundo ouvia... O “Amigo da Madrugada”... O Adelzon ele hoje em dia tá na Rádio MEC, quase ninguém vai lá ver. O Paulão produziu um disco dele agora lá na Rádio MEC com aquela turma dele. Dizem que tá muito bom o disco, eu não ouvi. Aí o que é que aconteceu? Marcou o estúdio. Naquela época ele namorava a Clara Nunes. Botou eu, Casquinha, Dona Ivone Lara, Sidnei da Conceição e o Flávio Moreira. Aconteceu o seguinte... Eu tinha aquele “Mel e Mamão com Açúcar”, que na época foi o maior barato, foi muito bem gravada... Tinha o Carlinhos do Cavaco, do conjunto “Nosso Samba”...

TP: Ele tinha uma pegada de direita!

WM: É, o maior barato! A gravação ficou excelente. Houve várias gravações, a música tocou no rádio, em tudo que era roda de samba, e o “Meu Apelo”: (cantando) “Eu vou acabar enlouquecendo...”. O Nei Lopes encontra com o Délcio Carvalho e diz: “Ô, Délcio, eu preciso conhecer o Wilson Moreira, que eu conheço ele de nome, mas pessoalmente eu não conheço...”. O Nei trabalhava com o Reginaldo Bessa, ali na Rua Santa Luzia, um negócio de jingle... Publicidade, essas coisas. O Délcio me levou lá no prédio e quando o Nei me viu plantou uma bananeira: “Puta que!...” (rindo muito, gargalhando) Rolou no chão! “Wilson Moreira aqui, que barato!”. Aí o Délcio disse: “Eu vou te apresentar um cara que bota música até em bula de remédio!”. Aí foi aquela brincadeira toda. O Nei fazia uns eventos lá na casa dele em Irajá, morava na Honório de Almeida, não sei se vocês já ouviram falar nisso, era o Festival de Ensopado...

S: É... Continua tendo!

WM: Continua tendo? (rindo) Festival de Ensopado... Tinha até jurado, provadores... Primeiro lugar! Segundo! Décimo! (rindo muito) Era um barato! Naquela época os irmãos dele estavam aí... Tinha o Zeca, que cantava pra caramba, era cantor de gafieira... O Gimbo tocava no Estudantina... tocava um trombone fora de série... A família dele é toda de músico, né? Aí eu conheci a mãe dele, Senhorinha, de oitenta e tal, na época, e ele me manda a primeira letra, “Leonel e Leonor”, lembra disso? (cantando) “Oh, Leonor / Cadê Leonel, Leonor? / Viveu pro mar / Morreu de amor” Quem canta muito isso lá no Carioca da Gema é o Marquinho China.

S: Essa é a primeira da parceria?

WM: É... Aí um dia o João de Aquino me encontra na cidade de fala assim: “Ô, Wilson, tá de bobeira hoje à tarde?”, “Tô...”, “Vou te dar meu endereço!” Ele morava na Rua Belizário Távora, em Laranjeiras, acho que é aquela rua que tem um tobogã, né? Sobe assim! Eu tinha um Fusca... (ri muito) O Fusca encrencou... E não ia de jeito nenhum! Vou deixar aqui embaixo... (rindo) Fusca 64. Bom Fusca, mas não foi! Aí eu subi e não era lá em cima, era embaixo, fui parar lá em cima! Chego lá, Roberto Ribeiro tava lá, o falecido Roberto Moura, jornalista, era uma reunião pra mostrar música. Tava só eu, João, Roberto Ribeiro tava sendo lançado naquela época como cantor... Primeiro LP que o João ia produzir do Roberto Ribeiro... Um disco bonito... O João pegou o violão e eu comecei a cantar: (cantando) “Meu cavalo baio...”, e o Roberto começou a cantar junto comigo. Essa música ele gravou junto com os Golden Boys. Eles faziam o contracanto. Essa música tem uma história muito boa... “Canta outra!”. Aí eu cantei: (cantando) “Oh Leonor / Cadê Leonel, Leonor? / Viveu pro mar / Morreu de amor...”. Aí eu falei: “Essa é a primeira música que eu fiz com o meu parceiro Nei Lopes”. Cantei toda e o Roberto começou a cantar... “Essa já tá, hein!”. O Roberto Moura depois me disse “Tá essa e tá o ´Meu Cavalo Baio´”... Eu novo no meio e já gravando logo duas com um cantor de alta qualidade! O Roberto Ribeiro, se estivesse vivo, ele... (de olhos marejados)... Puta que pariu... Aquele cara cantava muito, né, rapaz? Coitado... Ele ficou desgostoso com os problemas da vida dele, né? A vista, começou a beber muito... A vista ficou vazada, né? Ficou igual aquele cara da novela “Sinhá Moça”, de olho branco... Parece que ele tinha vergonha daquilo, botava uns óculos... A ODEON... Gravadora... não é a ODEON... qualquer gravadora... Não vendeu 100 mil, não faturou, pum! (chuta com o pé) Chutou o Milton Nascimento, Djavan, Paulinho da Viola, Dona Ivone, não quis saber. E ele ficou meio chateado com aquilo... Não faturou... Ele já bebia, já gostava, aí, ó... (faz com a mão um gesto como se estivesse bebendo) A mulher dele não controlava direito ele... De vez em quando a sobrinha dele vem aqui, com o Adauto Magalha. Ela é passista lá pro lado do Império...

EG: Wilson, você foi parceiro do Paulo Brazão também?

WM: Não. O Paulo Brazão foi o seguinte: ele assinou embaixo uma música minha. Foi o responsável pela minha ida pra Mocidade. O Paulo Brazão tinha uma sogra, que era vizinha minha, morava em Realengo, na mesma vila que eu morava. O filho dela, cunhado do Paulo, era meu amigo e falou: “Ô, Wilson, o Paulo Brazão é lá da Vila Isabel, Cabuçu, Unidos do Acaú..”, muito anos... Lá na Rua Acaú... Engenho Novo, Vila Isabel... A Clementina de Jesus morou nessa rua! Acho que era Índios do Acaú! Nos anos 40, 50... Eu era molequinho e trabalhei no Grajaú muitos anos numa estamparia, por cinco anos. E via os caras cantando os sambas do Paulo Brazão, de terreiro. O cunhado dele então me apresentou a ele. “Wilson, esse é meu cunhado, o Paulo Brazão...”, aí eu falei “Pô, muito prazer, eu sou raia miúda, eu não sei se esse negócio é samba, se eu posso cantar pro pessoal...”. “Pode cantar, sim, você me mostrou aí, cantou pra mim, é bonito pra chuchu, isso é terreiro, rapaz! Você quer ir pra onde com esse samba?”. “Olha, eu sou da Unidos da Água Branca... mas eu vou me filiar à ala de compositores da Mocidade...”. E ele: “Pode se filiar e cantar esse samba que você vai se dar bem!”. Eu mandei fazer umas letras, mostrei pro presidente da ala de compositores, o Seu Eurico, e cantei: (cantando) “Bahia me recordo com amor / Quando eu vejo alguém falar / Terra de São Salvador / Bahia berço de grandes poetas / Uma terra que é esta...”.. Pô, esqueci! Eu tenho a letra aí, futuramente eu vou mostrar a vocês direito esse samba, pro Tiaguinho... Cantei na quadra e todo mundo cantou comigo, foi meu primeiro samba de terreiro na Mocidade sem parceiro! Depois foi que apareceu o Da Volta! Mas foi um barato... Com o aval do Paulo Brazão... Ele assinou... e eu fui! Eu tinha ele como um grande amigo meu. Eu lamentei quando soube que ele foi embora. Ele era conhecido como Presidente Eterno da Vila Isabel, né? Um dos caras que tinha mais samba-enredo. Era ele, Tolito...

EG: Quantos sambas você tem com o Nei?

WM: Ih, rapaz... Pra contar é difícil... Até hoje eu tenho samba inédito com o Nei. Tem coisas guardadas que a gente ainda não mostrou a ninguém... Ele tem guardadas minhas com ele também lá na casa dele, que ele não mostrou a ninguém ainda. É difícil, né? Às vezes o artista quer um tipo de música e não é aquilo, né? Aí ele ouve... A gente acha que vai dar um tremendo pé e se engana, né?

RF: O parceiro com quem você tem mais música é ele?

WM: É com o Nei. É o mais constante.

RF: Você conheceu o Silas de Oliveira?

WM: Era muito meu amigo. Eu não bebia, né?

RF: Vocês nunca fizeram samba?

WM: Não. É a minha mágoa, essa. Eu quando fui pra Portela ele ficou muito chateado... “Poxa, Wilson... a gente se dava tão bem, em vez de você ir lá pro Império...”. O Seu Natal era primo dele! “Seu Natal me convidou pra ir pra Portela, eu tô lá! Enjoei de verde e branco, tô no azul e branco agora!”. O Silas foi um grande, era um mestre. O Silas, rapaz... eu vou te contar! Cada samba enredo dele era uma coisa de louco! O próprio Geraldo Babão, que era também meu amigo...

RF: Padeirinho, você fez samba com ele?

WM: O quê? Pô... o Padeiro era... (fica de novo emocionado)... Não fiz... Minhas maiores mágoas são essas... O Padeirinho era meu amigo pra caramba... Puxa vida...

EG: Wilson... faz aí a seleção das mágoas, então... Não ter feito samba com o Silas, com o Geraldo Babão, quem mais?

WM: Silas, Babão, Eurico Costa da Mocidade, Paulo Brazão, Padeirinho...

TP: Cartola, você fez?

WM: Não, não cheguei a fazer, mas a gente não tinha muita intimidade... Ele gostava das músicas que eu fazia. Eu fiz um show com ele em São Paulo, no Treze de Maio, nos anos setenta. O Pelão, aquele jornalista de São Paulo, foi o produtor... O Pelão segura o copo...

(Edu, que conhece o Pelão, o imita segurando o copo, Wilson morre de rir)

WM: É! Assim! O Pelão é meu amigo! Ele veio no Espírito do Chope quando eu lancei o Okolofe. Tinha uma fila pra autógrafo, imensa... (rindo muito)... O Pelão fazia uma roda de samba toda segunda-feira no Treze de Maio, lá em São Paulo, com um conjunto chamado “Lá Vai Samba”. Era o falecido Doutor no repinique, Jones Santos no cavaco, Everaldo Cruz no violão e Carlão Elegante...

S: Falecido Carlão da Unidos de Lucas...

WM: Carlão teve um derrame, ficou muito mal... Eu fui até cantar em benefício dele, lá no Lucas.

RF: Quem mais estava nesse show em São Paulo?

WM: Cartola, Mano Décio, Babaú, Jorginho do Império... Eu pegava um ônibus aqui na rodoviária, às sete da manhã, chegava lá à tardinha. A gente se apresentava lá.

RF: Quando você teve o bar, o bar era ponto de encontro da moçada?

WM: Lá em Vista Alegre?

RF: É...

WM: Ia muita gente... Beth Carvalho, Sérgio Cabral, a turma de samba do subúrbio, pessoal do Império... Mas não era tanto como lá no Sobrenatural... Sobrenatural era fora de série...

TP: Wilson, mudando um pouquinho o rumo: você não toca nenhum instrumento de cordas, né?

WM: Não. Eu tentei aprender violão, mas quando eu ia levar a sério eu tive o acidente...

TP: Como é que você consegue essa expressão toda pra tanta melodia linda?

WM: Você sabe que o Rogério Rossini era um grande maestro... Ele dizia “Wilson não aprende isso não que você tem coisa muito bonita...”

TP: Vai atrapalhar!

WM: Vai se bitolar e não vai fazer mais aquilo! O Guerra-Peixe quando eu estudava música – eu fui bolsista lá no Museu da Imagem e do Som – em 67, 68, reuniu os alunos perante alguns jornalistas de Rio, São Paulo, Minas e Brasília e falou: “Eu vou apresentar aos senhores os meus alunos. Esse é fulano, esse é sicrano...”. E me apresentou: “Esse é o Wilson Moreira, compositor de samba de morro!” (rindo) E me mandou cantar alguma coisa que eu tinha feito durante as aulas. “Como é que você faz isso sem tocar instrumento?”. Tá na minha mente, né?

EG: Você tem um processo pra compor? Como é essa história de estar na tua mente, Wilson?

WM: Você sabe o que é? É vivência, né? Você conhece a “Canção de Carreiro?”

S: Belíssima!

WM: Aquilo ali, eu vivi! (cantando) “O som das rodas daquela carroça / Faz lembrar os tempos que eu vivi na roça / Esse cheiro de fumaça / É fogão de lenha de alguém cozinhando / O ranger das rodas / Vão me acompanhando...”. Sabe... (emociona-se) Eu morei num lugar lá em Realengo que tinha uma porteira, que tinha carroça ainda, e tinha vacaria, e tinha boi mugindo... (imita o som dos bois) Eu vendi muito estrume, rapaz! Era encomendado! Estrume de vaca para adubo de horta! De cavalo não gostavam muito, não! Mas de vaca? Aquelas patacas, grandonas! Eu apanhava aquilo, botava numa lata, uma porção, rapaz! Tinha espalhado pelo meio do mato. Eu botava numa lata e vendia. Então eu passava aquilo. Quando um belo dia eu tô compondo durante uma viagem lá pra Paraíba do Sul, eu, minha mãe e meus irmãos. Eu olhei, rapaz... Aquilo era bonito! Eu lembrei de tudo, rapaz! Aí comecei assim... (cantando) “O som das rodas daquela carroça...” Veio tudo na mente! (continua) “Faz lembrar os tempos / Que eu vivi na roça / Esse cheiro de fumaça...” Quando você vai pra roça você sente o cheiro de fumaça de comida no fogão de lenha (rindo)... Eu participei com música no Prêmio VISA... Foi muito bem aplaudida... Modéstia à parte... Sabe quem gosta muito mesmo dessa música? O Adelzon Alves! O Zeca Pagodinho não gravou essa música mas canta em show. Uma vez eu fui assistir a um show dele lá no Metropolitan e ele falou no show: “Vou cantar uma música inédita aqui, que não tá no meu disco mas que eu gosto muito da música e do compositor, meu parceiro, Wilson Moreira!”. Aí o pessoal levantou pra me aplaudir. Que beleza! (rindo) Aí ele começou... cantou tudo, rapaz! O Zeca é maluco!

EG: Tá tudo ligado ao que você viveu, né?

WM: Exatamente. E eu acho que tem a ver com a origem dos meus antepassados. Meu avô tocava sanfona! Minha mãe falava que vovô saía lá pro meio da roça com a sanfona pendurada nas costas e ficava três, quatro dias...

TP: Já imaginou essa música com sanfonas?

WM: Putz!

RF: Porque tem gente que compõe como se fosse mulher...

WM: Uns tem que beber...

RF: Conta a história do “Senhora Liberdade”, Wilson!

WM: Eu trabalhava no presídio... O Nei, muito esperto... Fez a letra toda e eu musiquei. O Nei é muito esperto...

RF: Mas ele fez pensando nessa história de você trabalhar no DESIPE?

WM: Exatamente. 35 anos lá... Aposentei lá, em 92.

EG: Wilson, conta de novo a história que você contou no intervalo, durante a sopa, daquele camarada que pagou teu chope...

WM: Pois é, rapaz... Eu tava bebendo ali na Praça Onze, chope na rua, um bom chope, na época eu podia tomar um bom chope, um shcnitt... (gargalhando) Aí veio um cara e pagou o chope! Pagou e deixou outros pagos. Aí a Ângela, minha companheira, foi correndo: “Por favor, chega aqui! Você pagou aqui por que?”. E ele: “Paguei porque esse homem aí merece! Eu quando tava guardado lá em Bangu ele sempre me tratou bem, com o maior respeito, é um homem que merece respeito, nunca fez mal a ninguém lá!”. Aí ela: “Tava guardado?”. E ele: “É. Eu tava preso!”.

(todo mundo ri muito)

EG: Quem mais passou por lá, Wilson?

WM: Nelsinho Rodrigues... que foi preso político, né?

TP: Ficava junto com os presos comuns?

WM: Não. Ficava separado. E de vez em quando eu era selecionado para trabalhar no Talavera Bruce. Sabe quem eu encontrei lá? Tinha um bocado de presas políticas! Jesse Jane! Ela anda por aí, né?

S: Hoje ela é professora de História da UFRJ...

WM: Eu a via lá sempre!

EG: Wilson... Hoje, quem é quem tem a tua benção na música brasileira?

WM: Arlindinho. Zeca Pagodinho. Serginho Procópio, que é meu parceiro também. Rapaz... tanta gente, essa garotada nova que tá começando... Marquinho China... Ele gosta das coisas que eu faço...

S: Wilson... E a sua parceria com o Moacyr Luz?

WM: O Moacyr veio aqui em casa... (rindo) O Moacyr... De manhã cedo, eu tava aqui, tocou o interfone, eu fui abrir e ele já tava lá no meio da vila, procurando onde era a entrada da casa. Aí eu chamei e ele veio. E veio com uma música: “Seu Wilson eu vim aqui e trouxe uma música pra gente iniciar uma parceria...”. E eu falei: “Pô, mas eu faço música...”. E ele: “Não... Agora é ao contrário, tu vai botar letra!”. “Não tem dúvida, eu boto a letra aí...”.

S: Ah, a letra é sua?

WM: É. A letra é minha.

S: É uma das raras que você é só o letrista, né?

WM: Não... Eu tenho muita coisa...

TP: Tem uma com o Pedro Amorim...

WM: Tem. Eu tenho muita coisa... Eu faço muita coisa simultânea. Com o Paulo César Pinheiro é não dá, né? (rindo) Eu tenho umas parcerias com ele, mas a letra é dele... O Aldir, agora, eu vou mandar música pra ele...

EG: Wilson, vamos terminando... Você hoje tem a consciência de que está com o nome escrito na história da música brasileira?

WM: Graças a Deus!

EG: Como é que você gostaria de ser lembrado daqui a 50, 60, 70 anos?

WM: Eu vou durar 200 anos, pô! (gargalhando) Olha, rapaz... Eu tenho tanta coisa que eu fiz aí na música, e tem tanta gente que eu gosto... E essa juventude que gosta de mim... (se emociona) É um carinho danado, rapaz... Eu fico até... “Que é que eu vou fazer pra essa rapaziada?” (cantando) “Ô mel / Mamão com açúcar / Eu também quero encontrar / Um lugarzinho no céu...”. Vamos nessa! E olha... eu acho muito legal esse trabalho que vocês estão fazendo comigo... Eu agora nesse fim de ano eu faço 70 anos... Se der pra eu estar com todo mundo junto... Engraçado...

EG: Tem alguma bagunça programada?

WM: Aqui no Rio estão querendo fazer. Lá em São Paulo já tá mais ou menos engatilhado. O Pedrinho, filho do Elton Altman, falou: “Guarda essa data que ela é minha!”.

TP: Nós vamos todos de ônibus, hein?

WM: É mesmo, rapaz? Eles estão querendo fazer até disco lá comigo... Lá no SESC Pompéia... Vai ser um barato!

RF: Ah, Wilson! Quem te botou o apelido de Alicate?

WM: Foi o Xangô da Mangueira. Nos anos 60 eu chegava falando com a rapaziada... Vem cá, dá a mão aqui...

(Tiago estende a mão)

TP: Ai!

WM: (rindo) Aí o Xangô tinha um amigo chamado Valdomiro do Candomblé, que tinha uma mão toda arrebentada... Machucada. Eu não sabia... Eu apertei a mão dele e ele botou a mão pra trás, ficou me olhando... E o Xangô... “Esse é o Alicate, a mão dele não é mole não!”.

S: Wilson... De tudo o que você falou, duas coisas eu acho muito importantes... Você é uma memória de uma região que fez samba no Rio de Janeiro, que é muito pouco documentada, que é a região da zona oeste, Realengo, Bangu...

WM: Sabe que é mesmo? Vou te dizer um negócio... Realengo tinha muitos músicos. Eu já falei, né? Neco, o Darly Louzada, tinha uma cantora chamada Jurema, que tinha um namorado que morava em Realengo e que tocava cavaquinho chamado Caciporé! Muito bom. Aquela região era fértil!

S: E a memória é muito pouca, né?

WM: Não cortando sua boa proposta... Deixa eu falar uma coisa... Lá em Realengo tinha um clube chamado Grêmio Estudantil de Realengo, e eles faziam às segundas-feiras, nos anos 60, um sarau de jazz. Tinha o Trio Ternura... O Toco da Mocidade cantava na boate Drink, um vozeiraço! Hoje em dia é compositor da Mocidade. Até me falaram que ele anda meio doente, eu tenho que visitar ele, que ele é muito meu amigo... Um cara que é da fundação da Mocidade, com grandes sambas-enredo... Eu também me magôo de não ter samba feito com ele, sabe? Ele era cantor, naquela época, da boate Drink, tempo da bossa-nova. Ele cantou nesses cabarés, nessas boates que tinham em Copacabana, no Beco das Garrafas... Ele tem muita história bonita pra contar... Quando o Johnny Mathis vinha ao Brasil, procurava o Toco! O Toco cantava um fox... (cantarola)... cantava de um jeito que parecia o Johnny Mathis, um inglês fluente... Eu era pé-de-valsa, o Toco era crooner de um conjunto chamado Melódico Rubi. E eu ia dançar lá... (cantando) “When somebody love you...”. Toco cantava isso muito bem! Sabe que o Johnny Mathis ia a Bangu procurar o Toco?

S: Essa é ótima!!!!!

WM: O Toco cantava no Cassino Bangu... E o Johnny Mathis cantava lá! Ia lá, encontrava com o Toco... Tinha o Juarez Machado... Maestro...

S: Wilson, uma última intervenção... Você conheceu algum lugar da África?

WM: Não... É minha mágoa não ter ido lá ainda... Tenho vontade de ir lá... Pelo tipo de música que eu faço... (cantando) “Luanda, Luanda ê, ê / Luanda, Luanda, á, á...”... Bonito, né?

EG: Wilson, valeu, Wilson!