17.5.10

MEU JARDIM DE OBSESSÕES

Preciso lhes dizer umas coisas hoje, e já lhes explico porque começo dizendo que "preciso" - verbo impositivo (quis mesmo dizer impositivo) direto.

Quero, antes, que vocês que me lêem tenham em mente o cenário e os personagens à mão, o cenário e os personagens que presenciaram (e que protagonizaram) o que vou lhes contar. Chegava ao fim a sexta-feira e eis a mesa na rua do Rosário (em ordem de ocupação da mesa, ferindo, que seja, suscetibilidades): Babolé, Leo Boechat, esse que vos escreve, Hans, Betinha, Luiz Antonio Simas, Luiz Carlos Fraga e o Marechal. Diante dos portais da abadia, bebíamos as maravilhas alemãs, belgas, escocesas e holandesas que o abade, sempre infernal, trazia à mesa com um sorriso diabólico. Falei em Luiz Antonio Simas e preciso (de novo, o mesmo verbo) citar uma de suas frases que se tornou célebre:

- Tenho um jardim de preconceitos que cultivo todo santo dia.

Para que meus detratores não digam que estou pondo palavras, jardins e preconceitos na boca do maiúsculo professor, confiram a declaração aqui. Luiz Antonio Simas disse a frase - chegou, em algumas ocasiões, a enfeitá-la pondo um regador em uma de suas mãos ["Todos os dias, ao acordar, vou ao meu jardim de preconceitos regá-lo com o regador cheio para fazê-lo mais viçoso"] - e houve aplausos (eu mesmo, confesso, fui um dos que quase pediu bis) e nenhuma crítica (sou dos que rebatem qualquer crítica em direção a ele). Tomaram nota de tudo? Vamos em frente.

Lá cheguei com a única e exclusiva intenção de beber as delícias trazidas de dentro da caverna pelo diabólico abade. Mas, qual o quê. Foi eu sentar e começou o assédio (omitirei os donos das vozes que me chegavam em tom de fogo flamejante):

- Sabe quem eu acabei de encontrar?! Eliomar Coelho!

- Ih! Nessa mesma mesa, hoje, almoçou a cúpula do PSOL! O Pratinha estava!

- E o Moacyr, hein?!

Outro, mais afoito:

- Como anda tua história com o Moutinho?

Eu mal terminara de dar o primeiro gole, prosseguiu o tiroteio:

- O Astor Bar vai entrar no Comida di Buteco?

Pousei o copo e sorri. Lembrei-me não somente da patrulha dos bombeiros de gasolina. Lembrei-me, sobretudo, de Nelson Rodrigues. Escreveu o pernambucano:

"Eu sou assim, e digo mais - convivo muito bem com as minhas idéias fixas."

Mais:

"De vez em quando, alguém me chama de “flor de obsessão”. Não protesto e explico: - não faço nenhum mistério dos meus defeitos. Eu os tenho e os prezo. Sou um obsessivo. E aliás, que seria de mim, que seria de nós, se não fossem três ou quatro idéias fixas? Repito: - não há santo, herói, gênio ou pulha sem idéias fixas. Só os imbecis não as têm."

Sorri porque - nem precisaria desse expediente, é claro - abateu-se sobre mim a certeza de que eu estava, ali, divindo mesa com homens e mulheres (uma mulher, apenas) que não tinham - nenhum deles! - sequer o espectro tênue do pulha ou do imbecil. Todos, conhecedores do que me vai na alma, sabiam que era importante alimentar o obsessivo. E começaram, num movimento que me pareceu ensaiado, a arremessar em minha direção as minha idéias fixas, as minhas obsessões, os meus defeitos consubstanciados e encarnados nos meus personagens fixos.

Foi Luiz Antonio Simas, por exemplo, que num tom paternal (troço que sempre me comove) me sugeriu a retirada do oriki de Ogum que anunciava o BUTECO. Foi quando me veio a voz, nítida, do pernambucano obsessivo, me sugerindo a transcrição da confissão em prece que agora ocupa o outdoor eletrônico do blog. Pensei, num primeiro momento, que fosse um delírio provocado pela trapista que eu bebia, servida dentro de uma banheira de cristal. Não era.

E dei de ficar ali, remoendo as vaias de meus detratores que não compreendem - simplesmente não compreendem - as minhas chamadas obsessões. Dão a elas, diversos nomes, diversas justificativas, julgam minhas obsessões sem ao menos reconhecer a genialidade da sacada rodrigueana. "É muita vela pra pouco defunto", "Deixa o fulano em paz", "Não ligue para o que diz beltrano", "Você acaba sendo cabo eleitoral do sicrano", e vou recebendo, como sapatadas, esses julgamentos e lichamentos públicos que nada - eu disse NADA - alteram com relação a meu compromisso com minhas idéias fixas. Como se fosse santo em cavalo no terreiro, a certeza cravou-se na minha cabeça quando entrei no táxi que peguei na Primeiro de Março:

- Tijuca, por favor.

O sujeito me olhou de alto a baixo e disse:

- E aí? Já foste ao restaurante da Sudbrack, Edu?!

Um de meus leitores, o taxista.

Até.

6 comentários:

Claudio Renato disse...

Acho que você, caro Edu, tem idéias fixas e, às vezes, acende muita vela pra pouco defunto. Foi nesse sentido o meu primeiro comentário no Buteco, já se vai mais de um ano, quando me esbaldava de rir com a pesada artilharia que você disparava contra o PSOL. Mas quem não se diverte diante desse cruzeiro, dessas velas todas? E adianta falar com você para segurar a onda? Nem quero.

Como leitor, quero que continue assim mesmo. Mas vou evitar acender cigarro nesse posto de gasolina.

Um abraço muito carinhoso,

Claudio Renato

Eduardo Goldenberg disse...

Ô, Claudio, sabe que eu nem me lembrava disso?! Fui agora dar uma xeretada aqui e não achei... De toda forma, estás mesmo certo. Eu mesmo, todos os dias, digo de mim para mim mesmo:

- Chega!

Mas eu não resisto - nem aos botequins mais vagabundos e nem aos meus personagens fixos.

Abração, mano.

Unknown disse...

KKKKK
Muito bom, Edu...
È a fama!!!!

Mudando de assunto. E as novidades sobre o encontro do Comida de Buteco, bem como a ofensiva contra o plagiador Chalita.

Queremos notícias!!

Um abraço

BRUNO

AOS QUARENTA A MIL disse...

Acho que cada um tem a vela que merece, alguns merecem várias!

Três ou quatro idéias fixas , para o Nelson, mas no seu caso mil e uma idéias fixas! Porém não dá pra mudar nem um tiquinho.

Se é pra ler abobrinhas, leio o EGO, se é pra ler mentiras leio O Globo inteiro.
Nem imagino , comprar um jornal sem antes saber das opiniões do Buteco, Do histórias do Brasil e do Quem é vivo sempre aparece, das pataquadas do nosso dia a dia!!!

Continue assim , um "perseguidor" (moderado) muito bacana !

Blog do Pian disse...

E que esse teu jardim seja sempre regado!

O Buteco também é leitura obrigatória de minha parte.

Um abraço,

R.Pian

NADJA GROSSO disse...

Edu
Igual a você não existe, podem até tentar te imitar porém amigo não conseguem. Continue sendo VOCÊ, "PERSEGUIDOR" eles devem sentir a sua falta pois tenho certeza que você consegue incomoda-los, para você eles apenas passaram pois os verdadeiros amigos continuam juntinhos com você.